quarta-feira, 8 de julho de 2015

ARTIGO – Pálido Ponto Azul (PMA)

PÁLIDO PONTO AZUL
Paulo Maria de Aragão(*)


Quase invisível, não mais do que um grão de areia, perdido em meio à poeira estelar, manifesta ares de paz. Nosso minúsculo planeta circula em torno de um sol secundário, na fímbria de uma galáxia formada por 100 bilhões de estrelas, a Via Láctea, conhecida por sua extraordinária beleza. Mesmo que impressionante pareça, é apenas uma entre um bilhão de outras do cosmo conhecido no aglomerado de mundos e sóis.

Não se trata de cenário ficcionista, das histórias de Flash Gordon, mas mostra que as criaturas terrenas, por mais que penetrem fundo no espaço sideral, jamais encontrarão o seu fim. Muitos segredos hão de ser desvendados, gerações do porvir, certamente, conhecerão criaturas de outros sistemas. Como disse Duncan Forgan, astrofísico da Universidade de Edimburgo, na Escócia: “Há civilizações inteligentes fora da Terra e elas poderiam estar presentes em até quase 40 mil planetas”.
Os extraterrestres, se dotados de inteligência superior, observam-nos e são cientes da miséria e crueldades cometidas pelo homo sapiens. Já não estariam revoltados com tantos horrores? No Brasil, ficariam pungidos com a violência, corrupção, falta de escolas e hospitais, com as “primeiras páginas” dos periódicos expondo pacientes amontoados nos “corredômetros”. Na mesma página, o jornal noticia que uma socialite americana “só tira selfie quando está perfeita”.

O culto à imagem reflete a sociedade imagética, agitada na obscuridade e no vazio, embora consciente e responsável por seus desmandos e dramas. Esquecido não fica o sanguinário califado islâmico, decapitando e crucificando cristãos, crimes que empalideceriam o Coliseu Romano. Imensos são os progressos materiais; maiores ainda as privações e a miséria, gênese de todas as formas da debacle humana.

O Hubble aponta o grão de areia, este magneto orquestrado no equilíbrio da infinitude do universo. Não seria um espetáculo suficiente para sustar nossas ambições guerreiras? Por que não priorizar recursos para o bem da humanidade? Afinal, somos, aqui, meros hóspedes, em breve estada, o presente não passa de um instante. O segundo que flui já é pretérito. Nada representa embeber-se na soberba da falsa superioridade do proselitismo arrogante. Estes pensam realizar vôos de águia, vão às alturas e na queda despenam-se como galinhas assustadas tornando ao poleiro.

Telescópios sondam os céus, pesquisas espaciais intensificam-se, mas em parte alguma o Universo encontra limite: à medida que mundos sucederão a mundos, sóis a sóis; e, continuamente, legiões de astros se multiplicam a ponto de confundir-se na poeira cintilante dos abismos cósmicos. Olhos voltam-se à abóbada celeste e o homo sapiens, apesar da sua insignificância e limitação, segue em sua busca. Ora, se não conhece nem mesmo as profundezas dos oceanos, não se inspira aplicar recursos na erradicação da pobreza e de incuráveis moléstias, como ousa explorar o universo financiando-se da tragédia de seu semelhante?

Num programa de pesquisa especial da NASA, a Voyager captou imagens da Terra, fotografando a superfície do "pálido ponto azul", dele distando 6,4 bilhões de quilômetros, evidenciando o nosso pouco valor no mundo desconhecido. Difícil é entender que haja, na partícula anil, discórdias, fome, renhidas disputas por seus espaços, poder e dinheiro num infinito etcétara. quando aqui nenhuma coisa nos sustém: viemos do pó e a ele voltaremos; nascemos nus, e nus morreremos.

Jamais se viu, e nunca se verá, uma transportadora especializada em mudanças de riquezas terrenas para o plano superior. Nada se leva do grão vivo azul, aos olhos de Gagarin, e não se sabe até quando ele baloiçará, neste palco, sob a iluminação deslumbrante das estrelas e a orquestração da lei gravitacional.

E, aqui, no bailado do mundo neoliberal, as pessoas se despersonalizam e se mecanizam cada vez mais, atraídas pela maximização dos lucros, ao passo que o humanismo, primaz atributo das realizações humanas, decai de importância. O individualismo selvagem, almas estreitas permanecem insensíveis à dor e ao sofrimento humano. Sentencia o provérbio: “Tudo nasce, cresce e morre; tudo passa e o tempo corre”. Vestígios arqueológicos de cidades, outrora formigueiros humanos, hoje são ruínas desérticas calcinadas pelo sol.

Despotismos, soberanos, tiranos, dominadores, presentes nos fastos da História, hoje, sequer indícios de pó, tiveram seus nomes esquecidos no tempo. De tal sorte, ruíram as grandezas dos impérios e seus esplendores: aqueles são os mesmíssimos de hoje.

* Paulo Maria de Aragão 
Advogado e professor 
Membro do Conselho Estadual da OAB-CE
Titular da Cadeira nº 37 da ACLJ



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