terça-feira, 19 de janeiro de 2016

ARTIGO - Ainda Somos o País do Futuro? (RMR)

AINDA SOMOS O
PAÍS DO FUTURO?
Rui Martinho Rodrigues*


Éramos o país do futuro. Tínhamos uma dinâmica demográfica favorável. Éramos uma nação jovem, com uma grande força de trabalho. Agregávamos à população produtiva, todo ano, uma grande parcela da população total. Já não somos tão jovens.

Agregamos uma parcela cada vez menor, a cada ano, de novos contingentes de trabalhadores à população economicamente ativa, adicionando parcelas cada vez maiores de aposentados e pensionistas aos inativos. Perdemos a chamada janela de oportunidade demográfica.

Éramos um país rural em mudança para as cidades. Os neocitadinos se modernizavam. Hoje somos um país urbano. Esgotou-se o manancial rural a ser modernizado. Perdemos este potencial de crescimento.

Expandíamos a fronteira agrícola, compensando a baixa produtividade. Já não temos tanto espaço para alargá-la. Mais uma facilidade perdida.

Tínhamos um rico potencial hidrelétrico. Aproveitamos os melhores projetos. Restam os mais distantes e de menor qualidade, agora limitados por novas exigências ambientais. Mais um trunfo nos foi subtraído.

As vagas nas escolas eram restritas. Bastava expandi-las e aprendia-se alguma coisa nelas. Éramos um país de analfabetos. Bastava alfabetizá-los. Hoje somos escolarizados, mas é precário o nosso letramento. É mais complicado empreender uma recuperação em massa. Mais uma dificuldade decorrente do não aproveitamento de oportunidade.

A carga tributária era baixa, onerava menos a atividade produtiva, deixava margem para aumentos e realizávamos grande parte dos investimentos com superávit fiscal. Hoje os tributos representam um pesado ônus, deixam estreita margem de possibilidade para aumentos e temos déficit.




Contraíamos dívidas, mas fazíamos usinas hidrelétricas, aeroportos, estradas, linhas de telecomunicação e outras obras da infraestrutura de transportes e serviços. Hoje contraímos dívidas sem fazermos obras.

Responsabilidade e sentido do dever eram parte do senso comum. Hoje, influenciados pelo contexto internacional, que Norberto Bobbio chamou de “era dos direitos”, inflamos as demandas com aumento de despesas, enquanto vivenciamos o ocaso do senso do dever, de que nos fala Giles Lipovetsky, em prejuízo da nossa produtividade.

Ainda somos o país do futuro? Sim, não somos um país sem futuro. Só ficou so far far away...


** Artigo publicado na edição de hoje (19.01.16) do Jornal O Povo.




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