O MORIBUNDO GALANTE
Aluísio Gurgel do Amaral Júnior*
O desfile de parentes, amigos e curiosos aumentava com o
correr das horas. A casa diminuía e rareava o café, o bolo, a tapioca, o
cuscuz, tudo porque Zé Tomé teimava em permanecer, para as alegrias de suas
incansáveis esposa e filhas. "Gracinha, minha sobrinha, me desculpe, mas
se o mano não se for até domingo, tenho que ir embora cuidar dos negócios em
Tauá!". E ela assentia compreensiva.
Súbito barulho vindo do quarto e todos acorrem. Talvez o
gigante finalmente se despeça. De fato, Zé Tomé não respirava bem e movimentava
os braços vagarosamente. Suas mãos pareciam segurar algo com certo carinho.
Suas sobrancelhas formaram dois arcos lindos, emoldurando os olhos fechados
enquanto um ruído intenso prorrompeu de seu peito e... um gemido.
Todos se olharam interrogativos. "Será que
morreu?", indagou uma voz vinda do fundo do quarto. E Zé Tomé, que
permanecia de olhos fechados, franziu a testa e respondeu numa expiração
profunda: "Morri não, fiz foi acordar!". A família em alívio. Na
verdade o alívio foi geral, até o mano de Tauá se acalmou.
Uma diarista cuidadora segura a mão do moribundo teimoso e diz que todos ficaram preocupados pelo fato dos gestos e do semblante em êxtase.
Uma diarista cuidadora segura a mão do moribundo teimoso e diz que todos ficaram preocupados pelo fato dos gestos e do semblante em êxtase.
Em voz pausada, Zé Tomé relatou: "Eu estava sonhando
com uma moça linda. O olhar dela era cativante. O rosto era angelical. Em
determinado momento, ela se aproximou, pegou as minhas mãos e apaixonada me
pediu um beijo..."
– E o senhor deu,
Seu Zé Tomé? – perguntou a diarista cuidadora, ao que ele respondeu galante:
– Naturalmente!.
*Aluísio
Gurgel do Amaral Jr.
Juiz de Direito,
Professor, Músico, Escritor
Titular da Cadeira
de nº 14 da ACLJ
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