sábado, 20 de setembro de 2014

ARTIGO (AS)

DIFERENTES SEMELHANÇAS
Arnaldo Santos*

As eleições deste ano estão permeadas de simbolismos com vários e importantes significados históricos, só possíveis em uma sociedade com características tão singulares como a brasileira. O primeiro deles é o fato de a eleição estar sendo disputada entre duas mulheres, e, como todos sabemos, no Brasil a mulher ainda ocupa um espaço pouco significativo na política, apesar do seu largo espectro, e de a legislação eleitoral prever um percentual mínimo de trinta por cento reservados para elas. Os últimos números das pesquisas estão a indicar que pela primeira vez teremos uma eleição disputadíssima entre duas mulheres, e nem os mais experientes pesquisadores e cientistas políticos são capazes de prever o resultado. Mas os símbolos não se esgotam aqui.

Além de mulher, uma é negra (e nem preciso falar do preconceito racial), de esquerda, ambientalista respeitada internacionalmente, de origem pobre como o ex-presidente Lula, só tendo sido alfabetizada quando tinha 18 os anos. A outra também tem origem de esquerda, é militante desde muito jovem, lutou contra a ditadura, foi presa, torturada e foi a primeira mulher eleita para a Presidência do Brasil.

A História brasileira não registrava até aqui um panorama nem parecido com esse, e mesmo os mais renomados historiadores, cientistas políticos e sociólogos não poderiam prever que a democracia brasileira, em tão pouco tempo, evoluísse ao nível que se nos apresenta nestas eleições. Se esses aspectos são relevantes para a nossa história política, mais importante ainda é observar que essas singularidades assumem um caráter sociopolítico que perpassa a disputa meramente eleitoral, para quebrar um paradigma de tradição machista e de polarização entre o PSDB e o PT, que predominou até aqui durante os últimos 20 anos, desde a primeira eleição do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.

Mesmo incorporando todos esses valores históricos-políticos, culturais, eleitorais e sociais esses aspectos não são, ou pelo menos não devem ser, os únicos definidores nem das eleições e muito menos do que é substantivo para o futuro do país, pois quando analisamos o que representa em essência o conteúdo de cada uma das propostas que as principais candidatas apresenta, os eleitores com menor grau de criticismo, e que formam o maior contingente, encontram significativas dificuldades em fazer sua opção, pois ambas não apresentam grandes diferenças em seus programas, exceção feita à proposta de autonomia jurídica ao Banco Central apresentada por Marina Silva, e esse não é um tema que desperta o interesse da maioria, embora seja extremamente importante.

Como gestor absoluto da moeda, o BC atua para manter a estabilidade macroeconômica, através das ações de política monetária, gerenciando as taxas de juros para manter a inflação sob controle – ou seja – quando os preços sobem e pressionam a inflação, o BC sobe os juros, e vice-versa.

Como a meta de inflação é definida pelo governo, a candidata Marina entende que sem essa autonomia o BC não tem independência, e atua sob influência política da Presidente Dilma – ou Presidenta, como prefere ela mesma.

A propósito, o primeiro BC no mundo a incorporar esse regime de autonomia jurídica foi o Banco Central da Inglaterra, onde o seu presidente atual é um Canadense, contratado mediante um processo de seleção internacional pela análise de currículo, e não por indicação política. Mas será que o que funciona na Inglaterra, funcionaria no Brasil?


*Arnaldo Santos
Jornalista
Doutor em Ciência Política
Titular da Cadeira de nº 13 da ACLJ

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