quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

DISCURSO (LA)




Fala do Dr. Lúcio Alcântara saudando o empresário Beto Studart na solenidade em que este tomou posse na dignidade de Membro Benemérito da Academia Cearense de Literatura e Jornalismo, no dia 05 de dezembro de 2014.

Designado para saudar Beto Studart, em nome da Academia Cearense de Literatura e Jornalismo, atribuo a escolha, entre tantos confrades merecedores da distinção, aos laços que me prendem ao agraciado. Amizade relativamente tardia, consolidada nas aventuras empresariais e políticas que juntos vivenciamos. O que temo é comprometer a sobriedade desse ato, exigida pela liturgia acadêmica, ao incorrer em excessos ditados pelo coração, e por isso mesmo perdoáveis.

Em artigo inaugural da revista “Laços”, comemorativa dos dez anos de vida da Fundação Beto Studart, seu presidente, nosso homenageado de hoje, afirma textualmente: “enveredei por muitos caminhos e muitas estradas”. Nenhum desses foi para si um beco sem saída, ponto final de uma trajetória. Ao contrário, as múltiplas experiências contribuíram para forjar um caráter determinado, com vigor bastante para ultrapassar obstáculos com os quais se defrontou ao longo da exitosa caminhada. Processo certamente iniciado no convívio familiar, como reconhece, na casa paterna anexa ao Hospital de Messejana, dirigido por seu pai, matriz da mente sensível e solidária que impulsiona as suas ações sociais. À distância imagino o que possa ter sido a influência do pai na sua formação, pois, de gerações diferentes, fizemo-nos próximos, movidos pelo mesmo ideal de ampliar a assistência médica e promover a saúde da população.

O Dr. Carlos era o médico e administrador experiente que varou governos para fazer daquele hospital o centro de tratamento de doenças do coração reconhecido nacionalmente, mais tarde por mim batizado em preito de justiça com seu nome. Está aí um bom exemplo de quanto pode uma liderança exercida num contexto de continuidade administrativa. Eu, o jovem médico idealista guindado ao cargo de Secretário de Saúde do Estado, ávido por acertar, identificando problemas e possíveis soluções, encontrei nele interlocutor útil e prestativo. Por seu intermédio vim a conhecer a Ana Maria, a senhora Beto Studart, convidada a participar da minha equipe, uma colaboradora marcada pela simplicidade, competência e integridade, atributos que a identificam como exemplar servidora pública que foi por muitos anos. Esposa e mãe, tem sido a parceira solidária no lar e na Fundação, o que enseja a realização dos projetos comuns. Entre tantos caminhos trilhados pelo Beto esteve o da política, um breve, mas intenso interstício à vida empresarial, um insucesso que vivemos juntos. A política perdeu, as empresas ganharam com o monopólio da sua atenção e energia criadora. A experiência não foi como possa parecer um evento fugaz, um mero impulso pessoal, mas expressão genuína de um vocação para as causas coletivas, como demonstra o curso de sua vida.

Em meados do Século XIX Rudolf Virchow dava contribuição decisiva para os fundamentos da medicina, ao estabelecer o papel da célula no desenvolvimento da doença. Nascia a chamada patologia celular. Acontece que o cientista era também político com ativa participação na vida pública da Alemanha; resumia seu ideal de conciliação entre a medicina e a política na frase de sua autoria: “A medicina é uma ciência social e a política não é mais do que a medicina em larga escala”. Com esse conceito fundava a chamada medicina social.

Tomando por empréstimo o pensamento de Virchow é razoável admitir que o ambiente empresarial é um espaço onde se faz a política por outros meios. A empresa privada é cada vez mais chamada a interagir com o público, a desempenhar um papel social que deixa de ser responsabilidade exclusiva do Estado, enquanto as associações de classe se tornaram centros dinâmicos de debates políticos. Se isso não relativiza o conceito de propriedade impõe-lhe, forçoso reconhecer, encargos adicionais que exigem postura nova do proprietário. O ensaio do Beto na política não foi em vão, serviu como oportunidade para apurar seu interesse pelas demandas das pessoas de interesse geral, ou de cunho particular. Seu desempenho à frente da Federação das Indústrias a cuja presidência ascendeu por mérito, revela que continua político numa acepção ampla da palavra, operando em um cenário adequado à sua objetividade, focada em resultado e qualidade. Mergulhado nos últimos dias na leitura da  biografia de San Tiago Dantas deparei-me com a revelação do autor de que o biografado elegera como fio condutor de sua vida a tríade saber, ter e poder.

San Tiago soube, estudou muito e ensinou na cátedra e em seus escritos; teve, acumulou fortuna como advogado notável e homem de empresa; pôde pouco, vítima da aversão da política brasileira aos intelectuais, homens de ideias preocupados em estabelecer plataformas ideológicas e programáticas orientadoras da ação dos partidos políticos. Prova maior disso foi a recusa pelo Congresso  de seu nome para Primeiro-Ministro no parlamentarismo da era Goulart.

Aceita a tríade de San Tiago como roteiro de vida para os que têm legítima ambição, se aplicada ao nosso agraciado, em seu estrito campo de atuação, constata-se que a realiza integralmente. Beto sabe, porque aprendeu nos livros e nas duras lições da vida; Beto tem, porque ganhou pelo esforço do trabalho inspirado no seu tino empresarial; Beto pode, quanto empreende para gerar riqueza, criar emprego e apoiar pessoas carentes; atinge o equilíbrio entre ser e ter, a homeostase que pacifica e conforta o espírito. Sabedoria de ser, tendo; de ter, sendo. Como a figura da parábola do evangelho, multiplica os talentos que recebeu para atingir um número cada vez maior de beneficiários.

A expressão institucional da sua generosidade manifesta-se na Fundação que carrega seu nome, criada para atender pessoas e entidades carentes de apoio. São basicamente duas as suas linhas de ação: apoio técnico e financeiro a projetos, e o programa de concessão de bolsa-talento. Este último, voltado para a geração de oportunidades que permitam vicejar talentos constrangidos por limitações econômicas e sociais. A par dessas iniciativas de caráter geral, estende a mão solidária para  atender necessitados no melhor estilo cristão, quando uma desconhece o que a outra faz. Com os negócios concentrados nas finanças e na construção civil, da curso à sua inquietude criativa, apoiando empreendimentos inovadores tal o desenvolvimento de um coração artificial, ousadia científica de inspiração atávica.

A outorga do título de benemérito que hoje lhe é conferido em festiva e prestigiada solenidade deve ser encarada como a celebração do triunfo, o valor do trabalho empregado com louvável obstinação. Benemerência sistemática, planejada e eficaz lampejo generoso que conforta e acende o pavio da esperança em tantas almas necessitadas.

Almejo, por fim, que a honraria que ora recebe ilumine sua história de fida como um capítulo pedagógico da didática do sucesso, a orientar vocações de empreendedores econômicos e sociais, para compreender que o êxito individual será incompleto se não considerar a realização do bem comum e da paz social como um propósito a alcançar.

LÚCIO ALCÂNTARA

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