quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

ARTIGO (RMR)


A POLÍTICA E O SEGREDO DE JUSTIÇA
Rui Martinho Rodrigues*


O petrolão acumula montanhas de provas. Sucessivas deleções premiadas, escutas telefônicas judicialmente autorizadas e registros eletrônicos de transações, entre outros meios de prova, parecem indicar outro recorde: o de evidências. Os dados coletados pela Polícia Federal (PF), o Ministério Público Federal (MPF) e o juiz de primeiro grau, que preside a instrução criminal, serão encaminhados ao STF, já que parlamentares são relacionados entre os acusados. Cumpra-se a lei, no que concerne ao foro especial por prerrogativa de função. Acrescente-se que o processo correrá em segredo de justiça, atendendo ao imperativo de preservação do bom nome dos acusados, até que as acusações sejam esclarecidas.

As imunidades parlamentares, todavia, restringem-se a “...opiniões, palavras e votos” (art. 53 da CF/88). Transações em torno de negócios da Petrobrás não se confundem com o objeto de garantia da imunidade citada. A preservação do bom nome de quem é acusado parece justa, legitimando o segredo de justiça, falando-se de “lege ferenda”. O direito ao bom nome poderia ser dado, nas mesmas circunstâncias, a todo cidadão? Os que arrostam o ônus da vida parlamentar merecem tal proteção como prerrogativa da função? Ainda que assim o seja, a justa preservação do bom nome de pessoas acusadas colide, no caso, com o princípio da publicidade dos negócios públicos e dos atos processuais, popularmente conhecido como “transparência”.

Diante de uma colisão de princípios temos que sopesar os valores e interesses em conflito e avaliá-los comparativamente. A proteção da pessoa do acusado (conforme a boa doutrina garantista), em um prato da balança, o interesse público em outro.

O segredo de justiça, segundo tese de livre docência do prof. Cândido de Albuquerque, não está bem regulamentado. A igualdade republicana estará preservada, se só políticos têm a honra pessoal protegida pelo segredo de justiça? Tal proteção inclui os atos ligados a negócios particulares? Ou a fraude em licitações é parte da função parlamentar, bem como a evasão de divisas, concussão ou corrupção ativa e outros crimes se enquadram na proteção aos votos e palavras proferidas no exercício do mandato?

Ainda que parlamentares estejam protegidos diante de acusações ligadas a negócios “extraparlamentares”, vazamentos frustraram a proteção dada pelo segredo de justiça. As acusações tornaram-se públicas. Nomes foram divulgados. A honra pessoal, diante destes fatos, estaria melhor protegida se o processo fosse público. Primeiro porque saberíamos se os parlamentares cujos nomes foram divulgados como integrantes do petrolão estão realmente incluídos na denúncia do MPF. Segundo porque conheceríamos o teor da defesa e até o alcance da denúncia relativa a cada nome.

A quebra do segredo de justiça é do interesse dos acusados e da publicidade republicana dos atos processuais, além de contribuir para a salvaguarda das instituições democráticas, a defesa da probidade administrativa e da credibilidade do Judiciário.


*Rui Martinho Rodrigues
Professor – Advogado
Historiador - Cientista Político
Presidente da ACLJ
Titular de sua Cadeira de nº 10


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