NEIDE AZEVEDO LOPES
E SEU SISTEMA DE AFETOS *
E SEU SISTEMA DE AFETOS *
Vianney Mesquita*
No momento em que cedemos aos AFETOS, a
Terra se metamorfoseia; já não há inverno nem noite, e tudo – tragédias, tédios
e deveres – desaparece. (Ralph Waldo Emerson. Y Boston-Mass.,
25.05.1803; †Concord-Mass., 27.04.1882).
No
Domingo da Divina Misericórdia, caído no dia 11 de abril de 2010, há exatos
cinco anos, experimentei a delícia de ler um mimo do Criador, obsequiado à
imensa poetisa Neide Azevedo Lopes, logo a mim por ela substabelecido.
A
Quadra Pascal ora vivida, a terminar do Dia de Pentecoste, é espiritualmente
propícia para se apreciar arte tão edificante, a fim de se teorizar e, em
especial, praticar metros e simpatias, como faz a autora de Teoria dos Afetos, desde que adquiriu
uso da razão, quando sua vida passou a coincidir com uma rima rica.
Neide
Azevedo Lopes fez-me evocar a saudosa poetisa piauiense Sônia Leal Freitas, no Cedro do
Éden, monumental obra por mim
comentada no texto das suas guarnições em 2002, a rogo seu, após lhe proceder à
revista textual e gramatical.
Na
teoria – e na prática – dos afetos, também quedo pasmado, como a relembrar o Metal Rosicler,
de Cecília Meireles (1960), menos por identidade estilística e mais pelo
esplendor vocabular e elevação ideativa, fluência e estro desdobrados,
centuplicados a cada elaboração. Nalgumas passagens, Neide, também, amostra
similitude com Gabriela Mistral (Lucila de Maria del Perpétuo Socorro Godoy
Alcayaga), Nobel de Lireratura (1945), no seu Ternura, enquanto
noutras estâncias aparece, ainda, com a elevação comovente da Quarta Marquesa
de Alorna (Leonor de Almeida Portugal de Lorena e Lencastre).
Eu não tinha este rosto de
hoje,/ Assim calmo, assim triste, assim magro [...] Eu não dei por esta
mudança/ Tão simples, tão rápida, tão fácil. [...] – Em que espelho ficou
perdida a minha face? (C.M.)
Senhor! Tu que ensinaste,
perdoa que eu ensine; que leve o nome de professora, que Tu levaste sobre a
Terra... (Oração da
Professora, G.M.).
Se me aparto de ti, Deus de
bondade,/ Que ausência tão cruel!/ Que me leva a um abismo tão terrível/ O
pendor infeliz da humanidade (M.A. Obras poéticas da Marquesa
de Alorna, 1844).
Pelo
fato de bem o saber, Neide Azevedo Lopes emprega, com propriedade, graça e
exatidão, os expedientes figurais admissíveis na poesia, aformoseando
superfluamente o encantamento de suas composições. E assim, tomada por um
enlevo anímico, veemência dos escolhidos, se achega ao Ressuscitado, para o
Qual também solicita o leitor a rezar, ao apreciar suas esmeradas produções.
Tal
como sucede com a saudosíssima poetisa Sônia Leal Freitas (Deus a tenha em Sua
glória!), sua originalidade e inspiração multíplice de elaborar
representações, conformando-as extraordinariamente à Dulcisonam et canoram Linguam Cano, parecem acercá-la de Florbela
Espanca (Flor Bela d’Alma da Conceição Espanca), em Alma da Conceição, Livro das Mágoas e Charneca em Flor.
A ave da noite rasga a tenda
do meu abrigo / e despeja um grito estreito, longo, a língua do punhal./
Caminho dentro dele um corredor comprido sem fim e sem saídas./ Invento a minha
fuga e salto dentro do vulcão medonho/ que me vomita em postas. (S.L.F.)
Saudades! Sim ... Talvez ... E
por que não? ... Se o sonho foi tão alto e forte./ Que pensara vê-lo até à
morte/ Deslumbrar-me de luz o coração! / Esquecer? Para quê? Ah, como é vão!
Que tudo isso, A ... (F.
ESPANCA).
Também
os efeitos imprimidos nas expressões de musicalidade do seu metro fazem-me
evocar os rafaéis e michellângelos da Capela Sistina, bem assim a expressão da
alma nacional da Galícia, de Rosalía de Castro Murguía (cuja casa, em Padrón-A
Coruña-Espanha, tive a ventura de conhecer) no seu O Cavaleiro de Botas Azuis, bem como neste excerto de poema, transferido ao leitor
em língua nacional galega:
Cantares Galegos
Adiós, rios, adiós fontes/
adiós, regatos pequenos (sic) /adiós, vista dos meus ollos:/ non sei cando nos
veremos.
Miña terra, miña terra/ terra
donde me eu criei/ hortiña que quero tanto/ Figueiriñas que prantei.
A
imortal NEIDE AZEVEDO LOPES, ex-presidente da Academia Cearense de Língua
Portuguesa, perfaz uma estrofe em estâncias de dez ictos do soneto
petrarquiano, a exornar a poética tematicamente múltipla, de estética
inimitável, beleza desigual, em proporção direita à magnificência de sua
adorável pessoa.
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