AFIRMAÇÃO REPRIMIDA
Paulo Maria de Aragão*
Em proporções epidêmicas, a Aids, a nova peste negra, atormenta a
humanidade, a exemplo do surto do vírus ebola. Entre as guerras localizadas, já
preocupa o pânico, terror com a criação de um califado nas zonas conquistadas
do Iraque e Síria e pelas atrocidades praticadas. Sofre o homem também os
efeitos do progresso, pelos quais é arrastado num turbilhão cada vez mais
louco. A automação eletrônica parece não permitir que ele seja mais feliz.
Torna-se beneficiário e vítima da ciência.
Afora a violência de si contra si mesmo, há violência dele contra os
bens naturais. Sacrifica a natureza, escasseia a ocorrência da fotossíntese.
Paradoxalmente ao que procura, as chaminés das fábricas, os gases desprendidos
dos veículos, o aumento da poluição sonora acarreta ao ambiente e à saúde
humana, inclusive, o aumento da pressão sanguínea, do ritmo cardíaco e das
contrações musculares. As metrópoles estão envenenadas. Nelas há carência de
oxigênio e excesso de gás carbônico. Atrás da imponência transformam-se ainda
em fonte de selvageria, em indústrias do medo.
A tecnologia trouxe ainda a industrialização e a urbanização. Com elas
surgiram consequências delitivas. Não obstante as preocupações sociais que
aumentam assustadoramente, não representam totais tão trágicos, quanto as
motivadas pelo automóvel.
Os índices de acidentes de trânsito no país são estarrecedores. Em 2012,
registraram-se mais de 60.000 mortos - um aumento de 4% em relação a 2011,
quando foram pontuados 352.000 casos de invalidez permanente. Números
dramáticos, um desafio à competência dos administradores urbanos, aos
engenheiros de tráfego. E as estatísticas padecem sempre de deficiência
fundamental: são considerados mortos em acidentes apenas os falecidos no local.
Estudo realizado pela Organização Mundial da Saúde - OMS, concluiu que 20% das
vítimas morrem no primeiro ano após os desastres. Além disso, o que dizer dos
órfãos que ficam? E das mães que choram a própria viuvez?
Comportando-se como robô, por trás do volante, o homem esquece a
urbanidade e se torna mais agressivo à medida que é estimulado pelo espírito
emulativo. Um primata que se supõe um deus, soltando fumaça pela válvula de
escape e pela velocidade dos instintos represados.
O automóvel transformou-se numa arma. O motorista usa-o como meio de
afirmação social e de libertação das ansiedades reprimidas no confinamento do
cotidiano. Dele faz, ainda, instrumento circense e se torna exibicionista,
adquirindo, também, o prazer pelo perigo. Passa daí, a achar que o pedestre é
que tem obrigação de lhe dar passagem, não o inverso.
Por outro viés, a legislação continua tolerante e complacente. Estimula
a impunidade, ganhando dia a dia maior significação criminológica, por não
reprimir, com rigor, abusos dos que torturam indefesos e enlutam famílias. O
automóvel foi projetado para o transporte de pessoas e não concebido como
“arma” mortífera para ser colocado às mãos psicopáticas.
Estudando a psicologia do motorista, Roger Piret parte de um dos
instintos mais fundamentais e enraizados na alma humana: o instinto de domínio
(sentimento de potência), e ensina que um condutor de um veículo tende a
identificar-se com ele: “O homem forma corpo com o instrumento de propulsão,
fato este observado no cavaleiro e no ciclista, e mais acentuadamente, no
motorista, que dispõe de meios de locomoção puramente mecânicos”.
Não bastam os radares e outros
sofisticados aparelhos de fiscalização empregados pela polícia de trânsito.
Mais eficiente seria um trabalho voltado para conscientizar e educar. Ou seja,
uma sociedade cônscia de seus deveres e obrigações
dispensaria, até mesmo, semáforos.
O sinal vermelho não deveria servir de adorno. Triste realidade... e pelo andar da carruagem: salve-se quem puder.
O sinal vermelho não deveria servir de adorno. Triste realidade... e pelo andar da carruagem: salve-se quem puder.
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