segunda-feira, 25 de abril de 2016

ARTIGO - O Foco, a Ênfase e a Repetição (RMR)

O FOCO, A ÊNFASE E A REPETIÇÃO
Rui Martinho Rodrigues*



Os limites da percepção sofrem os efeitos do confinamento. Quem só ouve os seus pares perde contato com a realidade. Foi o que aconteceu durante a luta armada, fato conhecido como “paranoia dos aparelhos”. Tudo que discordasse do discurso dos companheiros era mentira. A avaliação das condições objetivas da luta resultou estupidamente errada.

O conhecimento pode ser obstáculo ao conhecimento (Gaston Bachelard); ou cegueira dos paradigmas (Thomas Kuhn). A catequese nas escolas e universidades, somada à doutrinação dos partidos e meios de comunicação levou à cegueira aludida, obstáculo ao conhecimento.

A desinformação também se faz presente. Foco, ênfase e repetição miram no “bandido” Eduardo Cunha, tão “bandido” quanto Sarney, Jáder Barbalho e Maluf. A reabilitação pode vir, conforme a conveniência. Qual a importância do personagem? Liderou ou presidiu o próprio partido? Não. Governou Estado, foi senador, prefeito de grande cidade ou ministro? Não. O presidente da Câmara tem autoridade sobre os deputados? Não. É apenas um deputado do “baixo clero”. Não tem a importância que se lhe atribui. O propósito é colocá-lo no foco dos acontecimentos para desviar a atenção dos escândalos que permeiam o Poder Executivo, que é de fato poderoso e por isso é mais responsável; e deslegitimar o impeachment.

Como chegou a presidir a Casa e sob a sua presidência a Câmara deixou de ser servil ao Executivo? Ele foi eleito presidente da Câmara quando o governo tentava destruir o PMDB, estimulando a criação de partidos às expensas da citada agremiação. Escândalos e impopularidade davam o tom da política. O PMDB era chamado a apoiar as políticas do governo, mas não a participar da sua formulação. A presidente tratava grosseiramente os parlamentares. Cunha não se fez líder. O governo praticamente o nomeou para tal função. Ele apenas mostrou disposição para enfrentar o rolo compressor do Planalto; conhece o Regimento Interno da Câmara, e sabe dialogar com os pares.

Alega-se que ele é investigado em grande número de inquéritos e até já foi denunciado, com denúncia aceita pelo STF. Foco, ênfase e repetição se fazem ao abrigo do esquecimento da garantia constitucional de presunção de inocência. Enquanto ele não for condenado presume-se: é inocente. Não se pode restringir direitos sem condenação prévia. Ele pode sim, presidir a Câmara. As “manobras” do Cunha são procedimentos regimentais de defesa semelhantes aos que a Presidente da República usa para se defender do impeachment.

O senador Renan Calheiros é igualmente investigado em numerosos inquéritos. Não foi denunciado ainda. O Procurador Geral da República, por coincidência, pediu busca e apreensão contra cinquenta e três deputados somente da ala oposicionista do PMDB; por coincidência só denunciou o oposicionista Eduardo Cunha, mas não denunciou o governista Renan Calheiros. Não existe um clamor contra o presidente do Senado, que não é apontado como o “bandido Renan”, embora já tenha passado por isso em outro momento. Paixão, conhecimento derivado de catequese e interesse em desinformar estão na raiz de tudo isso.

O presidente da Câmara não manda nos deputados, é apenas um entre 513 votos. Suas “manobras” são formalmente válidas e foram legitimadas pelo STF. Foco, ênfase e repetição representam táticas inocentes ou desonestas de luta política.

Menti, menti que alguma coisa há de ficar.


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