DIREITOS PATRIMONIAIS DO GAMETA
Reginaldo Vasconcelos*
O compositor Roberto Carlos intrigou-se publicamente com o Pelé,
quando acolheu um filho natural que apareceu, e na mesma época o ex-jogador de
futebol se recusou a reconhecer a paternidade de uma moça que nascera de uma
rápida aventura que ele tivera no passado, a qual depois morreu de câncer, sem
contar com as atenções afetivas de seu pai.
O assunto é sensível e delicado. Pouco antes de morrer o
então vice-presidente da República, José Alencar, fincou pé contra uma senhora
que surgiu do nada e se dizia filha sua, e que ele, ainda mesmo admitindo a eventualidade
de que ela pudesse ter sido gerada de uma de suas relações carnais de solteiro, não a queria como herdeira e insurgiu-se na Justiça, recusando-se
inclusive ao exame de DNA.
Agora o tema é abordado em novela da Globo, quando um milionário
se inclina e assumir a paternidade de uma sobrinha pobre, com cuja mãe teve um affair em tempos idos, e então ele
enfrenta a oposição da mulher e dos filhos, seus sucessores patrimoniais. Neste
caso, como se espera, a boa arte imita a vida.
Pessoalmente defendo que assiste razão ao Roberto Carlos, que
até então só tinha um filho, e que simpatizou com o descendente adventício. Também admito que pode ter tido seus motivos o
Pelé para rejeitar a filha, já que inclusive reconheceu depois uma outra que já lhe surgiu
na juventude.
Do mesmo modo, abono a resistência do rico idoso José
Alencar, e nesse ponto formulo uma tese jurídica própria, para entender que a
lei civil atual, nesse particular, é equivocada. Ora, qualquer um pode ser
adotado como filho e adquirir todos os direitos hereditários, concorrendo de
forma igual com os demais herdeiros do adotante – sem que haja qualquer
consanguinidade entre eles.
Isso significa que a filiação é condição muito mais afetiva
que genética, de modo que a mera condição acidental de descendente não deveria
credenciar ninguém a de repente adquirir direitos patrimoniais idênticos aos dos
que foram gerados de forma intencional e criados dentro de uma relação familiar
formal e duradoura – e o transcurso pacífico do tempo em determinada condição,
no espectro jurídico, como a de únicos filhos de alguém, sempre leva à prescrição aquisitiva de direitos.
Creio que o legislador moderno deveria fazer
temperamentos à lei de sucessões, à luz do que no passado já era previsto nas
Ordenações Filipinas, o primeiro código jurídico adotado no Brasil. Seria justo
e suficiente que filhos insuspeitados saídos já adultos do passado de homens de posses fossem credores de alimentos,
em sendo o caso, e do que mais lhe fosse preciso para manter a dignidade –
facultado ao pai biológico adotá-lo regularmente como filho legítimo, ou lhe
fazer objeto de disposições testamentárias, se por afeto e liberalidade ele o quisesse.
Nenhum comentário:
Postar um comentário