TOLERÂNCIA, RESPEITO
E VITIMOLOGIA
Rui Martinho Rodrigues*
Multiplicam-se as críticas aos “exageros” sarcásticos dos cartunistas vitimados pelo terrorismo na França, lembrando o respeito ao que é sagrado para o outro. Argumenta-se, ainda, com a vitimologia.
Mas devemos distinguir
entre tolerância e respeito. Democracia é tolerância com aquilo de que
discordamos e até condenamos moralmente. Tolerar significa apenas conviver
pacificamente. Respeito, porém, é um tributo a ser pago ao mérito, é um
reconhecimento. Não somos obrigados a render tributo ao que a nossa consciência
condena, embora sejamos obrigados a tolerar tais coisas.
A tolerância, porém,
tem limites. Popper, o arauto da tolerância, disse: “o limite da tolerância é a
intolerância do outro”. Gandhi, convidado a parar a resistência anticolonial na
Índia enquanto durasse a II GM, calou-se em face da indagação do Lord Mountbatten , vice-rei da Índia: “É possível enfrentar o nazismo com a
não-violência?”
O silêncio do apóstolo
da não-violência foi muito eloquente: a resistência cessou. Não é razoável
invocar a vitimologia em nome do respeito. Não há mérito a ser homenageado na
barbárie. Apedrejar mulheres e mutilar suas genitálias, usar crianças como
escudos humanos e como meninas-bombas, degolar, crucificar e sepultar pessoas
vivas são atitudes que não merecem nenhum respeito.
O sagrado, as religiões em geral,
não podem exigir respeito. Aquilo a que elas têm direito é a tolerância, na
medida em que não ultrapassem os limites do tolerável. A tolerância não pode
ser invocada para silenciar a crítica. As igrejas precisam de crítica externa.
Digo isso como crente que sou. Colocar-se acima da crítica prejudica as
religiões.
A crítica
despropositada ou fundada em afirmações falsas enseja a responsabilidade
criminal e nada mais. Não há necessidade de censura nem autocensura. O crime de
vilipêndio aos símbolos sagrados deve ser considerado com muita parcimônia. Na
perspectiva de lege ferenda o tipo
penal não deveria existir. O exercício da crítica alcança as organizações
religiosas, as ideias e as crenças, que inclusive podem criticar umas às
outras.
Vozes se levantam para
falar em “exclusão” de imigrantes e descendentes de imigrantes islâmicos na
França. Esquecem-se estes críticos de que a França oferece aos imigrantes as
delícias do Estado Provedor: escola de qualidade inteiramente gratuita;
serviços de saúde idem; programa de renda mínima que há vários anos já era de
seiscentos euros (mais de dois salários mínimos do Brasil).
Não há exclusão dos
serviços essenciais. Os que não querem se integrar, para manter suas tradições,
têm o direito a fazê-lo. Caso contrário, haveria um justo motivo de queixa.
Irracional é não querer se integrar e depois queixar-se de exclusão. Menos
admissível ainda é querer impor as suas tradições, recorrendo ao uso da
violência, à sociedade que acolheu imigrantes necessitados.
O argumento segundo o
qual os radicais são minorias no islã também tem sido lembrado. Minorias eram
os extremistas nazistas na Alemanha, e os comunistas radicais na URSS de
Stalin, e os japoneses radicais à época do militarismo no Império do Micado, e os
católicos fanáticos, ou oportunistas, por ocasião da Inquisição. Os radicais
não precisam ser maioria: basta que sejam dominantes. E eles muito
frequentemente são dominantes no islã.
Afeganistão,
Irã, Paquistão, Síria, Iraque, Líbia, Argélia, Somália, Mali, Nigéria, República
Centro Africana, Sudão, Iemen, Rússia, China, Índia, Espanha, França, Reino
Unido, EUA, e em todos os lugares do mundo onde o islã se faz presente, a
violência se instala.
*Rui Martinho Rodrigues
Professor – Advogado
Historiador - Cientista Político
Presidente da ACLJ
Titular de sua Cadeira de nº 10
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