DÍSTICO
APAIXONADO
Reginaldo
Vasconcelos*
Deu na Time. O piloto de jato americano gravou suas
últimas palavras na caixa preta do avião, quando o aparelho imbicava
irremediavelmente para o solo: “Ma, I love you!”.
Não sei que nome feminino está sintetizado nesse
minúsculo nickname,
tampouco saberia dizer por que razão o apaixonado militar não acionou a
poltrona ejetora a catapulta-lo sobre a morte. Também não dá para invocar
o super-homem, que faça o mundo girar ao contrário para livrá-lo da tragédia.
Só sei que foi assim, como diria o Suassuna.
O que importa aqui é o belo anúncio da paixão, o momento
grave do manifesto, a melancolia inefável que transporta. O rapaz ia morrer e
quis então registrar sua devoção à moça amada, grandiosa e definitivamente. Seu
gesto corresponde a fazer soar uma declaração de amor por todas as planícies do
universo, espalhar bandeiras com dísticos afetivos sobre os picos das
montanhas, cobrir o mar com rosas púrpuras, com dedicatórias em
bilhetes. Ele ia morrer e ele a amava.
Um dia desses vi pela rua uma mulher que amei demais. Ela
passava, eu passei, sequer me viu. Mas de dentro do carro tive ganas de
ejetar-me dali e ir abraçá-la na calçada, e dizer-lhe o quanto a amei no
passado, e apresenta-la à família como antigo bem-amado.
Diria às atuais donas de mim, senhoras da minha alma, que
aquela criatura inexpressiva um dia representara na minha vida o sino e a
ponte, o barco e o porto, a vela e a porta, a faca e o pomar. Fora eu um piloto
que fosse morrer naquela época talvez tivesse lembrado de timbrar o meu amor a
ela nos gravadores do avião, sem saber que, em não morrendo eu, que não morri, aquele
sentimento morreria, para converter-se em apenas nostálgica lembrança.
Penso que morreria de amor se fosse o caso. E por amor
mataria, se necessário, porque sou mesmo dado a esses rasgos amorosos. E por
amor trabalharia de pastor por sete anos, como teria feito o bíblico Jacob, o
qual queria desposar Raquel, “serrana bela”.
E se não fosse necessário tanto, mas fosse possível
conquistar a amada mulher pichando muros eu faria como o moço do subúrbio que
escancarou na parede mais suja, com a sua pior caligrafia, com tinta barata,
mas em letras garrafais:
Dea.
Te adoro, sua doida!.
E assinou: Jean.
*Reginaldo Vasconcelos
Advogado e Jornalista
Titular da Cadeira de nº 20 da ACLJ
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