O
MILAGRE REVERSO
Rui Martinho Rodrigues*
Há uma tendência para milagres na vida pública. Não temos
crescimento econômico, a indústria se retrai, não temos investimentos, mas
temos o menor índice de desemprego da nossa história. Eis o milagre. Mas,
milagre reverso.
A queda do desemprego se deve, em parte, ao crescimento
dos "nem-nem", assim chamados os jovens que nem querem estudar nem
trabalhar. Tecnicamente desempregado é quem procura emprego. Os nem-nem não são
desempregados. Os programas de transferência de renda inflaram a população dos nem-nem.
Os desempregados minguaram. Parte dos empregos "novos" são mera
formalização de trabalhadores avulsos. Outra faceta do milagre.
É milagre não termos investimentos públicos, tendo
recordes de crescimento da arrecadação de impostos, sobre uma carga tributária
extremamente elevada. Fazemos sempre algum superávit primário, mas a dívida
interna cresce estupidamente. Milagre reverso. O destino de tantos tributos não
se explica.
A dívida cresce sem que se faça investimento; pleno
emprego sem crescimento econômico: Milagre. Salvo se admitirmos muita
roubalheira e ineficiência como explicação plausível.
O milagre se torna maior diante da janela demográfica, momento
de transição da dinâmica populacional, com poucas crianças, por força da queda
dos índices de fertilidade, e poucos idosos. É oportunidade de crescimento, com
a maior parte da população em idade produtiva, com baixa demanda de despesas com
assistência. Este seria o momento de um crescimento acelerado.
Estamos jogando fora uma montanha de tributos, uma
oportunidade dada pela dinâmica demográfica e até há pouco tempo uma conjuntura
internacional favorável, com os nossos produtos primários se valorizando
grandemente. Argentina, Equador, Venezuela e Brasil têm os piores índices de
crescimento da economia e as contas públicas mais desorganizadas do continente.
Tudo em nome de convicções que sempre levam ao desastre. Somos perseverantes
nos erros.
Só pensamos em distribuir riqueza, não importa que isso
possa significar o sacrifício da galinha dos ovos de ouro, que são os
investimentos produtivos. Os “virtuosos” não pensam em melhorar a
produtividade, nem sequer em aumentar a produção bruta. Só pensam em distribuir
uma riqueza que supostamente já existe em quantidade suficiente, além de
presumidamente perene, dispensado o esforço de sustentação da economia.
É a Torre de Babel, em que se pretendia conquistar o céu
sem precisar morrer. Há até quem queira acabar com o trabalho. O neocarolismo
político sabe iludir. Diz que milagre foi o crescimento com investimento
produtivo. Só em logística investíamos 7% do PIB. Hoje se investem 2% em todos
os setores. Sabíamos a origem e o destino dos recursos. Os investimentos, até a
crise do petróleo, vinham do superávit fiscal, depois passaram a vir de
empréstimos. O destino eram hidrelétricas que ainda hoje nos abastecem, estradas
agora deterioradas, portos, aeroportos, sistemas de telecomunicação e habitações
populares.
Tristes trópicos.
Professor - Advogado
Historiador - Cientista Político
Presidente da ACLJ
Titular de sua Cadeira de nº 10
Presidente da ACLJ
Titular de sua Cadeira de nº 10
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