sábado, 12 de julho de 2014

ARTIGO (VM)

AMÁLGAMA,
de Cristiane Almada
Vianney Mesquita*

Cristiane Almada,
Amada, amalgamada, numa gama de amor.

Amor que gama, se funde e flama,
Sem ou com dor: amálgama-chama. (V.M.)

José Bento Monteiro Lobato, já ao tempo de sua notável produção literária, deplorava o desgaste do vocábulo poeta, decerto em razão da munificência emprestada pelo Movimento de Fevereiro de 1922 – a Semana da Arte Moderna: Que surrada andas tu, pobre palavra, e quão longe do sentido íntimo, pelo abuso de te vestirem quantos por aí medem versos nos dedos para uma periódica postura nas revistas!

Evidentemente, assistia razão ao enorme Escritor e patriota, em decorrência da supercopiosa produtividade de versos de gosto desabrido e estro somenos derramados por todos os quadrantes do País.

Se vivesse hoje († 1948), a decepção se teria proporcionado, por certo, haja vista a pletora poética de má qualidade no ativo fixo de nossa Literatura, somente perdendo feio, felizmente, para o metro de boa essência, bem mais substancioso no recheio literário contabilizado no Brasil.

A fim de sossegar um pouco os cuidados de Lobato, me faz surpresa a novel poetisa (este é o único feminino de poeta) Cristiane Almada, com a estreia do seu Amálgama, onde esparge inspiração, ao empregar tropos e expedientes figurais dispostos pela Língua de Reginaldo Vasconcelos, com vistas a demonstrar o engenho e a estética de suas estâncias, admiravelmente adversas à mesmice da vala comum.

O traçado das suas estrofes é inteligente, nalgumas passagens sobra cristalino; noutras circunstâncias, porém, parece cifrado ao leitor menos perspicaz, o qual, ao insistir na demanda de descodificá-lo, sem dúvida obterá sucesso, pois lábil dissimulação estilística.

Sua temática é genérica, indeterminada, gravita, porém, em particular, como é costumeiro, à órbita do amor, divisa de todos os versejadores da Terra. A arte da qual se reveste, contudo, é demonstrativa não apenas do depurado influxo, mas também de seus haveres intelectivos e perspicácia elocutória, conducentes a uma poesia revestida da especiosidade própria dos versos bem consoados empós colhidos do interior anímico.


Cristiane Almada, com toda a convicção, não é barda comezinha, nas palavras e na expressão inspirativa, mas poetisa ilusória do leitor, pois, se o poeta não ilude – sugere Giacomo Leopardi (1798-1837) – não conduz esse nome; e falar em poesia pensante é igual a referir-se a animal falante.


Eis, por conseguinte, à disposição do público este conjunto de bons versos para deleite do espírito e floração da alma, num tempo tão difícil, de cataclismos, tsunamis e conflitos de toda ordem, não apenas no terreno secular, como também, principalmente, na circunscrição dos eventos espirituais.
 *Vianney Mesquita 
 Docente da UFC 
Acadêmico Titular da Academia Cearense da Língua Portuguesa  
Acadêmico Emérito-titular da Academia Cearense de Literatura e Jornalismo 
Escritor e Jornalista

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