sexta-feira, 9 de junho de 2017

CRÔNICA - Quando o Inexistente Foi Julgado (RV)


QUANDO ALGO QUE 
JÁ NÃO EXISTE
MERECEU UM 
JULGAMENTO PROLONGADO
 Reginaldo Vasconcelos*


Durante esta semana o Tribunal Superior Eleitoral julgou uma causa morta e enterrada. Julgou uma tese preclusa, vencida, porque examinou a cassação de uma chapa eleitoral que já não existe mais. Existiu, mas de há muito está extinta.

A chapa foi eleita, a cabeça da chapa assumiu a Presidência, tomou decisões irreversíveis, foi deposta. O coadjuvante assumiu e está governando há tempos,  constituindo-se uma nova situação jurídica diante da consumação dos fatos.


Assim, chapa não há mais. Quem propôs a ação já se arrependeu e já não mais se interessa. Então, que chapa foi julgada? Será que passados vinte anos essa chapa ainda mereceria julgamento? Absurdo!

A certa altura, mandando a modéstia às favas – e com ela a sua dignidade – o Ministro Gilmar Mendes gabou-se de se dever a ele aquele julgamento extemporâneo – e com isso cobrou gratidão do colega Hermann Benjamim, por estar brilhando na TV, atuando na relatoria do processo.  Estarrecedor!

Gilmar Mendes segurou o processo por meses a fio, sob um pedido de vista confessadamente protelatório, pois justificou seu ato com a engorda da prova pelos fatos novos que então se desenrolavam.

Mas, estranhamente, na hora de julgar a causa, constatou que esses fatos novos não podem ser considerados, porque não constam da causa de pedir e da petição inicial. Eu posso com isso?



Ora, a causa de pedir constante da petição inicial é característica do processo civil, que não processa crimes de ação pública – e o processo eleitoral não é de ação privada. Ou em matéria de Direito eu já não entendo nada.

O que pensar do agente público que se mostra rigoroso demais na constatação da infração, demorando demais para reunir provas, e no momento da sanção está compreensivo e tolerante, compassivo e leniente? Não sei...

Enfim, só me resta lamentar que tenham participado dessa pantomima, a discutir o  sexo dos anjos, e quanto mais em trincheiras opostas, dois Ministros que são credores da minha maior admiração, bem como da minha incondicional estima, que são o carioca Luiz Fux e o cearense Napoleão Maia Filho.

De resto, é sofrer com o fato de que Dilma Rousseff não tenha terminado inelegível, para se corrigir a patacoada lewandoskiana, cometida durante o processo de impeachment, da qual o Ministro Gilmar Mendes teve a oportunidade e a coragem de fazer reproche grave.

Mas, por outro lado, tenho para comemorar que não se tenha ainda deposto Temer, evitando-se que o País combalido sofra nova convulsão – perdendo tempo com uma eleição indireta, para massacrar mais ainda o povo, e pasmar o mundo ainda mais.  

E quanto aos argumentos longamente expendidos pelos Ministros? Quem tinha razão sobre considerar ou não os fatos supervenientes, que não constam da causa de pedir, expressa na petição inicial? 

Bem. Isso não importa mais. O Direito é um vasto pomar no outono, cujos mais diversos frutos, ao alcance dos doutos, são os mais variados argumentos. Diz-se que Cícero, falando do púlpito, podia provar uma determinada tese, e em seguida convencer do contrário a mesma plateia exatamente.

     

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