PACTO
Luciano Maia
Vai, poesia
até os ermos da minha pobre terra...
Dá um abraço de orvalho às madrugadas
poentas do sertão... Dá-lhes alento.
Vai, calmamente pede aos passarinhos
que emudeçam ao menos um momento.
Não mereço a alegria dos seus
cantos.
Adentra a noite e o sono dos meus
pais
e pede-lhes, por Deus, ainda uma
benção.
Beija as suas frontes cheias de
saudade.
Diz-lhes que eu aprendi mal a lição
copiada no meu caderno Avante
e até as pedras choram meu destino.
À minha doce mãe, que me perdoe
pelas vezes que a fiz chorar. Por
lágrimas
derramadas por seu poeta-menino.
E diz ao meu irmão que não sou puro
como ele sempre quis acreditar.
Que o castigo e o remorso têm morada
em meu desconsolado coração.
Que a saudade me acorda e me golpeia
em meus sonhos de exílios e
distâncias.
Diz às minhas pretéritas amantes
que a elas, na verdade, eu nunca
amei.
Que só lhes presenteei de despedidas
e que as trai por nada, o
inconstante.
Vai, poesia.
À minha dor não tens que regressar.
Nossa aliança agora se desfaz.
Não fazemos, por certo, um belo par.
Não venhas ver-me, amiga, nunca
mais.
(Com paráfrase do poema Poste Ludum,
de Emil Botta)
:::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::
QUE COISA ÉS TU!
Reginaldo Vasconcelos
Olho
para ti e não sei o que estou vendo.
Que
coisa és tu, além de seres gente?
Ou
será que não és gente,
E
não sendo, serás santa ou serás súcubo,
Anjo
ou demônio,
Querubim
ou potestade?
Como
afrontas o mundo com esse escudo de cristal, tão frágil, e com essa adaga tão
cortante quanto o fio de carbono?
Que
confusão te apraz causar, que interesses revolver, com essa beleza de vela e de
lareira, de regato e de cascata?
Meu
Deus! A beleza é incêndio, é caudal, é catarata.
Que
veneno juntas ao açúcar dos teus olhos contra as abelhas do mal e a peçonha das
promessas?
Como,
dize-me, como te exclamas tanto, nos fazendo interrogar constantemente? Como te
afirmas sendo dúvida?
Como
pagas à vida a tua dívida de ter nascido assim: bela como filha predileta;
meiga como mãe no retratinho?
Como
podes ser a um só tempo leão feroz e sutil gazela – falcão da estepe e
passarinho da planície?
Como,
conta afinal, como se faz para sorver o teu passado e lamber o teu destino.
:::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::
PÁTRIA AMADA
Paulo Ximenes
Tão triste é sentir a pátria amada,
nesse talhão de incúria malfadada,
roçagando, assim, um povo inteiro
a um ermo escuro e traiçoeiro!
E os eleitos, em seus rasos passos,
cerram os punhos e cruzam os braços
beijam – em vão – a sua bandeira
como vissem nela a saga ordeira,
mas só cubam ouro em berço esplêndido
e o tangem em absconso vilipêndio!
Mas se erguerá da lama a mãe
tristonha.
Vem Joaquim! Tua alma é pura!
Vem livrar-nos, por Deus, dessa
vergonha
que se a água bate, insiste, e
fura...
há de morrer, um dia, a dor medonha!
::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::
JUSTIÇA
João Pedro Gurgel
Diante deste arcabouço de palavras
ancorado pela inefável ânsia de justiça
coloco-me diante da beligerância
em destronar verdades postiças.
coloco-me diante da beligerância
em destronar verdades postiças.
Ante o crime da falsidade
sem alarde, noticio
pois melhor a dor da verdade
que o torpe benefício arredio.
sem alarde, noticio
pois melhor a dor da verdade
que o torpe benefício arredio.
Se Ártemis me escuta,
saiba que não fujo à labuta,
por mais dura que seja a luta
do caminho do bem.
saiba que não fujo à labuta,
por mais dura que seja a luta
do caminho do bem.
A Justiça não se faz aquém,
posterga seu olhar no além,
faz-se no céu de um mundo altruísta,
ou nas pobres palavras de um jovem jurista.
:::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::
:::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::
TROCADILHO
Vianney Mesquita
Era um Da Vinci em camafeu de ouro
No juvenil decote de uma dama,
Pois o valido engenho ao tento chama
Um homem interessado no Tesouro.
Ele, insistentemente, examinava
A áurea peça (ou divinal suporte?)
Qual o lúbrico olhar de um consorte
E, encabulada a jovem se quedava.
Eis, pois, que o joão-ninguém não recuou
E, ante seu inaudito estupor,
Conforme não se lhe asava outrora,
Determinadamente perguntou:
- Aprecias a Ceia do Senhor?
:::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::
VIDA
Vicente Alencar
Os caminhos que
levam ao coração
são todos libertos e
abertos.
Às vezes, quando
começam a fechar-se,
a vida começa a se
perder.
A lei que rege os
destinos
não é a mesma que
rege os homens.
Compreender o
coração,
a vida e o próprio
destino,
somente é possível
quando vivemos
amores e dores.
(Publicado no livro POLICROMIAS - 2010 - Vários autores).
Nenhum comentário:
Postar um comentário