SÓ DEUS NA CAUSA!
Reginaldo Vasconcelos*
No nosso regime
presidencialista a “democracia representativa” é uma grande farsa – isto já é
ponto pacífico.
O eleitor brasileiro
vai à urna porque é obrigado a fazê-lo, e estando lá vota em determinado
candidato por critérios abstratos, circunstanciais – porque dentre as opões
propostas determinada figura é mais simpática, mais fotogênica, mais engraçada,
indicada por algum vizinho ou por algum cabo eleitoral, ou mesmo porque aparece
mais vezes na TV. Mais ingênuos são os que conduzem seu voto acreditando em
promessas de campanha ou para não dissentir de pesquisa eleitoral.
Pesquisas mostraram
que muito antes do fim do mandato de cada eleito os seus eleitores não sabem
mais dizer em quem votaram. Muito menos dizer por que o fizeram, obviamente.
Enfim, ninguém, nem mesmo os poucos que
por acaso lembrem quem foram seus candidatos nas últimas eleições,
acredita, ou tem a sensação de que no mandato eles o representem os interesses.
Até as pedras sabem
que ninguém investe numa campanha política milionária e desgastante por puro
espírito público, pelos belos olhos do povo, pronto a se sacrificar pela
felicidade e bem-estar do cidadão que o elegeu – porquanto uma vez eleito ele
comece a pensar numa maneira eficiente de conquistar novo eleitorado para o certame seguinte. Ele sabe, os que sufragaram seu nome até ali, com base nas
suas promessas de campanha, vão estar decepcionados.
Porém, como se sabe,
a reforma política não sai, porque quem teria que implementá-la iria sair
prejudicado pelos novos regramentos. É uma autêntica aporia jurídica, um
verdadeiro dilema lógico. Assim, somente por meio de uma revolução, com ruptura
institucional, o país sairia deste impasse, tendo em vista que a oportunidade
de fazê-lo pacificamente, adotando o parlamentarismo, por meio de um plebiscito,
se perdeu há alguns anos. E a revolução seria uma solução péssima, porque, como
sempre acontece, a emenda sairia pior do que o soneto.
Enquanto isso a Nação
vive em constante convulsão. Os três Poderes da República estão sempre em crise
surda, ora desarmônicos entre si, ora dependentes uns dos outros, tudo o que a
norma constitucional não admite.
O direito de greve,
por seu turno, preceito democrático sagrado, no Brasil de hoje converteu-se em
chantagem coletiva, em revolta popular, em agressão ao bem comum e ao
patrimônio privado. E para não perder apoio eleitoral os Administradores
Públicos de plantão vão sublimando a realidade, dizendo que estas manifestações
são exercício do direito de livre expressão.
Na verdade, a ideia
de democracia não pressupõe um grande saco de gatos nem um camburão de
caranguejos. Na normalidade democrática ideal os diversos interesses convivem
de forma harmônica, cada um aceitando os diferentes e respeitando as
diferenças.
Os princípios
republicanos, por seu turno, indicam que os confrontos ocorram no campo das
ideias, por intermédio dos três poderes, se necessário com a intervenção sadia de legítimas instituições sociais, como a OAB, a ABI, a CNBB, o Ministério Público, a Maçonaria, os
clubes de serviço, os órgãos de classe – nunca grupos sem personalidade
jurídica e sem liderança definida.
O que se observa no
País é a sociedade dividida em grumos antagônicos que adotam a violência em
detrimento do diálogo, desrespeitando a norma jurídica e desprezando a
intermediação da Justiça, enquanto o Estado se omite ou negligencia na
aplicação do seu poder coercitivo, pela concepção equivocada de que democracia e anarquia se confundam.
São as siglas criminosas e ilegais, dotadas de notoriedade pública, que enfrentam a polícia com poder de fogo equivalente; as torcidas de
futebol organizadas que se digladiam nos estádios e nas ruas; os sem-terra que invadem
fazendas e os sem-teto que ocupam prédios públicos e particulares, e que
enfrentam impunemente as tropas de segurança dos palácios de Brasília.
Índios aculturados que atacam
agentes públicos; agentes públicos fazendo greve e até policiais amotinados,
além de empregados de outros serviços essenciais como saúde, educação e
transporte que promovem paredismo violento, fazendo toda a sociedade refém de
seus corporativos interesses. Para não falar de manifestantes sem causa
específica e de black blocs que de
repente resolvem investir contra a paz social, sob os pretextos mais diversos.
Estes declaram guerra
à cidadania como um todo, quebrando e incendiando lixeiras, pontos de ônibus,
os próprios ônibus, caixas eletrônicos e mesmo as agências de banco, como também praticando
saques, sem poupar sequer as lojas de pequenos empresários. E até agredindo a
imprensa livre, o que destrói qualquer argumento democrático.
Diante desse quadro
caótico, a Presidente da República baixa um decreto que acolhe tudo o que se
possa vagamente classificar como “movimento social”, sem excluir os ilegais e
os violentos, dando-lhes voz em todos os níveis da Administração Pública. É a
baderna institucionalizada. Que Deus se apiede das nossas almas!
*Reginaldo Vasconcelos
Advogado e Jornalista
Titular da Cadeira de nº 20 da ACLJ
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