A QUERELA DA DESIGUALDADE
Rui
Martinho Rodrigues*
A desigualdade entre os homens é um importante problema
político, jurídico, social e econômico. Este último aspecto é hoje o nosso foco.
A parcela mais rica da população vem abocanhando uma fatia cada vez maior da
totalidade da riqueza do mundo, do PIB de muitos países.
Como um jogo de soma zero, cada vez que a porção do PIB
entregue aos ricos cresce, a parcela dos pobres diminui. Indignamo-nos diante
do crescente abismo entre ricos e pobres, na forma de uma marcha perversa e
insensata. Antevemos consequências sociais e políticas preocupantes.
Por outro lado, os pobres se enredam cada mais no
consumismo. Consomem aparelhos de telefonia móvel, condicionadores de ar,
automóveis, enquanto frequentam academias de ginástica e compram tantos outros
bens, serviços e utilidades... quero dizer, quinquilharias.
Mas, alimentos serão quinquilharias? A pandemia de
obesidade sinaliza que a fome já não é o grande problema. Apesar dos dois
grandes males, a pobreza crescente e o consumismo, os pobres estão vivendo
mais, estão se escolarizando mais, conforme se depreende do declínio das taxas
de analfabetismo e do crescimento dos anos de escolaridade média.
Isso tudo é uma tendência secular, que cada vez mais se
difunde pelo mundo. Segundo consta, só na China 400 milhões saíram da famosa
“linha da pobreza”, na Índia mais 200 milhões. Até no Brasil seriam algumas
dezenas de milhões, os que ultrapassaram a dita linha.
O aparente paradoxo dos pobres que ficam cada vez mais
pobres, desfrutando, porém, de cada vez mais conforto e utilidades, num mundo
em que os ricos acumulam parcelas crescentes da riqueza dos povos. A
contradição é apenas aparente. A riqueza material não é um jogo de soma zero. A
pobreza só é crescente quando comparada com a riqueza dos mais ricos. A pobreza
em termos absolutos, na forma de bens e serviços, quer sejam eles essenciais ou
supérfluos, não diminui de um lado quando a riqueza cresce do outro.
Mas não nos interessa que os pobres estejam tendo mais
conforto e escolaridade, vivendo mais, tendo mais acesso às utilidades. Caso
não tivessem acesso a tais coisas chamaríamos a isso pauperização. Ficaríamos
indignados do mesmo jeito. Mas agora os pobres estão desfrutando cada vez mais
de muitas coisas. Só nos resta a indignação diante da pobreza relativa, que
resulta da comparação entre ricos e pobres.
Não se pense que quem se preocupa com o que o outro tem, ao
invés de se preocupar com os seus próprios haveres, chegando a esquecer das
novas aquisições na sua lista de desfrute, é invejoso. Não somos invejosos. Não
estimulamos, não exploramos a inveja. Somos justos. Queremos igualdade.
Por isso negamos a melhoria dos indicadores de qualidade de
vida e denunciamos a pauperização. Temos Dulcineia para defender. Temos moinho
de vento para combater. Temos teorias, digo, temos pangaré
para montar e combater. Só assim poderemos dizer: olhe mamãe, com eu sou sábio,
corajoso e... justo!
*Rui Martinho Rodrigues
Professor e Advogado
Presidente da ACLJ
Titular de sua Cadeira de nº 10
Professor e Advogado
Presidente da ACLJ
Titular de sua Cadeira de nº 10
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