sábado, 21 de junho de 2014

ARTIGO (RMR) - DESIGUALDADE SOCIAL


A QUERELA DA DESIGUALDADE
Rui Martinho Rodrigues*


A desigualdade entre os homens é um importante problema político, jurídico, social e econômico. Este último aspecto é hoje o nosso foco. A parcela mais rica da população vem abocanhando uma fatia cada vez maior da totalidade da riqueza do mundo, do PIB de muitos países.

Como um jogo de soma zero, cada vez que a porção do PIB entregue aos ricos cresce, a parcela dos pobres diminui. Indignamo-nos diante do crescente abismo entre ricos e pobres, na forma de uma marcha perversa e insensata. Antevemos consequências sociais e políticas preocupantes.

Por outro lado, os pobres se enredam cada mais no consumismo. Consomem aparelhos de telefonia móvel, condicionadores de ar, automóveis, enquanto frequentam academias de ginástica e compram tantos outros bens, serviços e utilidades... quero dizer, quinquilharias.

Mas, alimentos serão quinquilharias? A pandemia de obesidade sinaliza que a fome já não é o grande problema. Apesar dos dois grandes males, a pobreza crescente e o consumismo, os pobres estão vivendo mais, estão se escolarizando mais, conforme se depreende do declínio das taxas de analfabetismo e do crescimento dos anos de escolaridade média.

Isso tudo é uma tendência secular, que cada vez mais se difunde pelo mundo. Segundo consta, só na China 400 milhões saíram da famosa “linha da pobreza”, na Índia mais 200 milhões. Até no Brasil seriam algumas dezenas de milhões, os que ultrapassaram a dita linha.

O aparente paradoxo dos pobres que ficam cada vez mais pobres, desfrutando, porém, de cada vez mais conforto e utilidades, num mundo em que os ricos acumulam parcelas crescentes da riqueza dos povos. A contradição é apenas aparente. A riqueza material não é um jogo de soma zero. A pobreza só é crescente quando comparada com a riqueza dos mais ricos. A pobreza em termos absolutos, na forma de bens e serviços, quer sejam eles essenciais ou supérfluos, não diminui de um lado quando a riqueza cresce do outro.

Mas não nos interessa que os pobres estejam tendo mais conforto e escolaridade, vivendo mais, tendo mais acesso às utilidades. Caso não tivessem acesso a tais coisas chamaríamos a isso pauperização. Ficaríamos indignados do mesmo jeito. Mas agora os pobres estão desfrutando cada vez mais de muitas coisas. Só nos resta a indignação diante da pobreza relativa, que resulta da comparação entre ricos e pobres.

Não se pense que quem se preocupa com o que o outro tem, ao invés de se preocupar com os seus próprios haveres, chegando a esquecer das novas aquisições na sua lista de desfrute, é invejoso. Não somos invejosos. Não estimulamos, não exploramos a inveja. Somos justos. Queremos igualdade.

Por isso negamos a melhoria dos indicadores de qualidade de vida e denunciamos a pauperização. Temos Dulcineia para defender. Temos moinho de vento para combater. Temos teorias, digo, temos pangaré para montar e combater. Só assim poderemos dizer: olhe mamãe, com eu sou sábio, corajoso e... justo!


*Rui Martinho Rodrigues
Professor e Advogado
Presidente da ACLJ
Titular de sua Cadeira de nº 10

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