quarta-feira, 8 de maio de 2019

CRÔNICA - Álgebra (TL)


ÁLGEBRA
Totonho Laprovitera*




Depois que o Jozias mudou de endereço, Valdim passou a frequentar o restaurante com menor assiduidade. Era sábado cedo, e Valdim, sabendo que Jozias é madrugador, afinal quem negocia com peixe e marisco tem que ser, foi fazer uma visita ao amigo. 

– Oi, Robertinha, cadê teu pai?

– Oi, Valdim, há quanto tempo!

– Como é que tá a dona Mazé?

– Mamãe? Tá bem... Papaiêêê, o Valdim!

– Já vou, peraí! 

Enquanto caminhava ao encontro de Valder, Jozias dava ordens ao cozinheiro: 

– Camocim, separa aí uns camarões chibateiros.

– O senhor comprou creme de leite pra delícia de peixe?

– Comprei, e Maizena também... Vê se economiza creme de leite que eu não tenho vacaria, não...

– Pode deixar... 

Parou, olhou para o Valdim, levantou o boné e coçando a cabeça falou:

– Mas, olha, quem é vivo sempre aparece...

– Deixa de ser falador, Teixa, que eu sempre venho aqui – falando em baixo tom e cerrando os olhos.

– Aqui, faz é tempo... Você pode até dar essa desculpa em casa pra Glaucinha...

– Para de besteira e pede logo pro teu garçom me servir uma cerveja.

Monsieur, s’il vous plaît, traz uma cerveja aqui pro doutor Valder!

– Já? E isso é hora de se beber?! –  gritou o garçom.

– Pra mim, é agora; pra você, deve ser hora é de dar o rabo, filho da puta!

– Deixa de ser corno, vê se respeita o doutor Valder e traz logo a merda dessa cerveja, seu bosta! Detesto falta de educação e respeito! –  sentenciou Jozias. 

Enquanto o folgado garçom trazia a cerveja, Valdim começou a puxar conversa com o amigo: 

– Conta, Teixa, como é que tá a vida?

– Bem, né?

– E eu sei? Como é que tá o Marquim?

– Tá bem... Quer dizer, eu não posso reclamar de filho nenhum, mas...

– Mas, o quê? Alguma merda?

– Sabe que eu me preocupo desde que ele era pequeno. Ele novinho já me perguntava:

– “Papai, o que é que eu faço pra ser bonito, inteligente e rico quando eu crescer?”

– E tu respondia o que, ignorante?

– Filho, acredite na reencarnação.

– Mas, rapaz, isso é resposta que se dê a um filho?

– Eu não aliso não! Aqui em casa vale a lei do Chico de Brito: “Escreveu não leu, o pau comeu!”

– Mas, e ultimamente, ele tá mais calmo?

– É, se bem que na semana passada eu me afobei e perguntei:

 Meu filho, pelo amor de Deus, como é que você consegue fazer tanta besteira num dia só?!

– E ele?
– “Acordando cedo”...

– Tem jeito não...

– Tem nada, parece até que tem um parafuso solto. Agora, o Ricardo...

– O que é que tem o Intelectual?

– É outro departamento. Vive pra estudar, não quer saber de outra coisa, chega já é exagero. Outro dia, imagina, ele tava agarradinho com um livro e eu perguntei:

 Meu filho, tá estudando o quê? E ele respondeu:

 “Álgebra!” Tai, rapaz, achei bonito! 

– Realmente...

– Ora, qualquer pai fica feliz sabendo que até álgebra o filho tá estudando. Mexe com a vaidade da gente.

– Também, não é pra menos...

– Você calcule, Valdim, que no domingo passado aqui tava chei, chei. Não se achava uma mesa sobrando nem pra remédio. Casa lotada! E eu, orgulhoso, só pra me amostrar, perguntei pra ele, na frente de todo mundo: “Meu filho, como é mesmo que se diz bom dia em álgebra?!”



COMENTÁRIO

Jorge Amado não era menor porque aplicava pornografia em suas obras, na fala de seus personagens...” manda comentar por Zap o confrade Adriano, acompanhando o Blog lá do Maranhão onde se encontra, rebatendo comentário do Prof. Vianney Mesquita sobre o estilo do confrade Laprovitera.

Eu acho ótimo esse tipo de debate no âmbito da Academia, em que se verifica o confronto entre as opiniões dos confrades sobre temas literários, estilísticos, gramaticais, que são livres e soberanas.

Ainda nesta semana eu e o bardo Luciano Maia “batemos luvas”, como se diz no boxe, sobre o título d'O Dialeto Cearense  o nosso ínclito Presidente Emérito Rui Martinho Rodrigues apoiando a tese dele, a Vólia botando lenha na fogueira, e tudo terminou convergindo para a revelação de um banal mal-entendido, pois já na Apresentação da obra a tese do nosso Da Maia está devidamente respaldada: não há dialetos no Brasil.

Aqui da curul da Presidência eu adoto a política do Capitão Bolsonaro, reconhecendo a cada um o direito de pensar e de dizer o que pensa, e de rebater as invectivas, sem que isso recrudesça para o campo dos ressentimentos pessoais – ou aplicarei a política de meus velhos pais, que obrigavam os filhos pequenos a se abraçarem, após um conflito por eles mediado.

Somos livres pensadores, e somos democratas. O Mestre Vianney tem uma estética mais rigorosa em relação ao uso da linguagem, como zeloso guardião da “última flor do Lácio”, enquanto o jovial Laprovitera prefere um estilo livre e alegre, homenageando a cultura popular, porém mantendo total domínio e controle da gramática. É o nosso Millor Fernandes, para nossa honra e júbilo.

Reginaldo Vasconcelos


7 comentários:

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

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  2. Dr. Vianei, a pornografia está na sua equivocada interpretação de um diálogo coloquial e realista, fruto de uma dita erudição que nega a cultura popular.
    Dispenso a sua crítica.

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  3. Este comentário foi removido pelo autor.

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  4. "Jorge Amado não era menor porque aplicava pornografia em suas obras, na fala de seus personagens..." manda comentar por Zap o confrade Adriano, acompanhando o Blog lá do Maranhão onde se encontra. Eu acho ótimo esse tipo de debate no âmbito da Academia, em que se verifica o confronto entre as opiniões dos confrades, que são livres e soberanas. Ainda nesta semana eu e o bardo Luciano Maia "batemos luvas", como se diz no boxe, sobre o título d'O Dialeto Cearense, o nosso ínclito Presidente Emérito apoiando a tese dele, a Vólia botando lenha na fogueira, e tudo terminou convergindo para a revelação de um banal mal-entendido, pois já na Apresentação da obra a tese do nosso Da Maia está devidamente respaldada: não há dialetos no Brasil. Aqui da curul da Presidência eu adoto a política do Capitão Bolsonaro, reconhecendo a cada um o direito de pensar e de dizer o que pensa, e de rebater as invectivas, sem que isso recrudesça para o campo dos ressentimentos pessoais. Somos livres pensadores, e somos democratas. O Mestre Vianney tem uma estética mais rigorosa em relação ao uso da linguagem, como zeloso guardião da "última flor do Lácio", enquanto o jovial Laprovitera prefere um estilo livre e alegre, homenageando a cultura popular, porém mantendo total domínio e controle da gramática. É o nosso Millor Fernandes, para nossa honra e júbilo.

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  5. Bem dito, presidente.
    Suas palavras me incentivam a ser melhor.
    Grato.

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