DUAS ESTÓRIAS
- DOIS SONETOS
Vianney
Mesquita*
Só há poesia no desejo do impossível
ou na dor do irreparável. (Charles-Marie LECONTE DE LISLE *Saint-Paul, 22.10.1818;
Voisins-le-Bretonneux, 17.07.1894).
Meu colega de departamento acadêmico na Universidade Federal do Ceará, Prof. Francisco Souto Paulino, ao
estacionar o carro nas proximidades do Sindicato dos Jornalistas do Ceará, para
onde se dirigia a fim de se reunir com outros profissionais de imprensa, foi
assaltado, recebendo um tiro do peito e outro na mão.
Desacordado e em estado grave, foi conduzido por sua mulher (a também
periodista Leda Maria) a um hospital, onde os projeteis foram removidos, tendo
ele permanecido institucionalizado por considerável tempo, porém, forro de
perigo, até receber alta.
A família mandou celebrar Missa de Ação de Graças, ocorrida na Igreja de
Cristo Rei, em Fortaleza, no dia 12 de abril de 2007, ocasião em que lhe dirigi
os versos que aí vão, produzidos na grade de SONETO, procedente da Provença antiga,
na sequência deste comentário.
Rota do Soneto
Não demora informar, sob o prisma histórico e com informações de público
domínio, o fato de o soneto – em provençal sonet
– haver sido cultivado por nomes prestigiosos da literatura pré-humanista, durante
a Renascença e após este período resplandecente da cultura ocidental.
Esta grade poética experimentou longos decursos de transformação,
constituindo relevante fato a determinação de uma forma fixa, concisa e
agradável, promovida por um pugilo de versejadores sicilianos, encabeçado por
Jacopo da Lentini (Lentini – Sicília-Itália, antiga Leôncio).
Não é defeso, também, referir que este grupo, a que Dante Alighieri
(1260-1321) chamou de Scuola siciliana
(em A Eloquência Vulgar), reunia-se
em torno do Imperador Frederico II, de Hohenstauffen (1194-1250), espécie de
mecenas, cujo secretário era Pietro dele Vigne (suicida no Inferno – Divina Comédia), e era constituído, dentre outros, por
Cielo d’Alcomo, o citado Jacopo da Lentini, Ruggiero Apugliese e Giacomo
Pugliese, todos eles cultores do soneto.
Francesco Petrarca (1304-1374), humanista da Toscana, nascido em Arezzo e
a quem equivocamente se atribui a invenção deste gradil poético, empregou sua
fórmula para cantar, nas Rimas, seus
(tão propagados pela História) amores pela bela mulher de Hugo de Sade, por
quem se apaixonou à primeira vista.
Da Itália, Francisco Sá de Miranda (1481-1558) levou a medida para
Portugal na primeira metade do século XVI. O soneto possui, hoje, quatro esquemas
básicos de acentuação, consoante taxinomia proposta por Sânzio de Azevedo (Para uma teoria do verso. Fortaleza:
Edições UFC, 1997), que reconhece outros delineamentos, cada qual com suas
variantes.
A propósito do emprego da assente grade siciliana, o Autor (em Otacílio
Colares e a coroa de sonetos, in: Dez
ensaios de Literatura cearense – Fortaleza: Edições UFC, 1985), num belo
escrito acerca desse extraordinário sonetista – 1918-1988 – sugere ao leitor
outro ensaio de sua autoria, publicado em 1970, no qual alude à chamada Geração 45 (in Poesia de todo o tempo, Edições Clã, pp. 63-8),
[...] no
trabalho de redisciplinamento do verso e, consequentemente, reabilitação de
antigas formas poemáticas, entre elas o soneto, quase banido da literatura
nacional, ao ponto de, em 1936, a coletânea A
Nova literatura brasileira, de Andrade Murici, não abrigar um só desses
poemas de forma fixa.
Esta quase proscrição – adita Azevedo – originou-se de uma epidemia desta
forma que grassou no Brasil de literatura pré-modernista, ensejando ao escritor
paulista Cassiano Ricardo (São José dos Campos, 1895-1974) divisar na antiga
composição provençal o pandêmico Sonetococcus
brasiliensis (opus citatum),
conquanto aquele Poeta do vale do Paraíba, em 1938, creditasse o soneto à conta
das [...] nossas mais caras recordações
(RICARDO, apud AZEVEDO, 1985, p.
102).
1 Souto Ressurrecto
As anunciadas estrofes representam uma ideação poética de quatro estâncias
– dois quartetos e dois tercetos ou trísticos. Aqui se destaca o emprego da
rima encadeada – hoje bastante rara em poetas novos – nos oito versos das duas
quadras, fato a conferir mais beleza à composição.
Acuso, no entanto, um
defeito – o fato de não haver consoado a primeira com a segunda estrofes, fato
do qual só me dei conta após a publicação, com a referência que procedeu a
respeito o Prof. Dr. Rafael Sânzio de Azevedo. Noutro lance, decerto, vou
consertar o desvio que impingi à grade e concertar as rimas.
E assim se vive; desta maneira se aprende...
Dileto e nobre
professor Paulino,
Cujo destino
seus amigos prezam.
Agora rezam
ante o desatino
Tão de inopino
quase as Parcas lesam.
No ápice do
abalo e da agonia,
Naquele dia -
trágico, funesto -
Bem mais que
presto, eis Leda Maria
Logo acorria
contra o termo lesto.
Empós extenso
tempo de hospital,
Não granjeando
a foice seu fanal,
Em vez de
condolências, há prolfaças.
Agradecidos,
pois, seus circundantes,
Ao Deus da
vida em todos os instantes,
Pios se
ajuntam em Ação de Graças.
2 Prof. Régis Kennedy
Este amigo e colega do magistério é natural de Pacoti, município vizinho da minha Palmácia.
Conheci-o na U.F.C. ainda quando estudante de Letras daquela instituição, onde
se graduou e pós-graduou. Procede de uma família muito fina e educada e é um
grande apreciador da Literatura, da Música e da Cultura como um todo, bem como
ocorre com seus irmãos Plauto Jackson e Adyrson Byron – ambos músicos e
compositores - (os outros, que são muitos, não conheço).
Professor de Língua Portuguesa e do idioma Inglês, trabalha duro em dois
contratos que mantém com as redes estadual e municipal de (Ceará e Fortaleza),
porém ainda lhe sobra tempo para o exercício das atividades do espírito (e do
espirituoso, também), em especial, na escrita, pois detentor de excepcional
texto.
Casado com Dona Rejane Carvalho Cruz, o casal têm dois filhos – Rafaela,
psicóloga clínica, pesquisadora e articulista de temas vinculados à Ciência de
Carl Gustav Jung, atuante na UFC, e em consultório particular; e Lucas
Vinícius, ainda garoto, acerca de quem me reportei em matéria publicada neste
jornal eletrônico no dia 18 de maio deste ano, indicando seu nome como verso
decassilábico perfeito – Lucas Vinicius de Carvalho Cruz - tal como é
dodecassílabo exato o crédito do poeta Olavo Brás Martins dos Guimarães Bilac.
Em 2 de fevereiro de 2004 – há um pouco mais de dez anos, portanto –
dediquei-lhe estas estrofes, também com a eiva de não rimar os versos dos
quartetos, a igual do que sucedeu com o primeiro soneto, há pouco reproduzido, falha da qual
me cumpre redimir.
No clerical mister de
professor,
Em que te descometes
da missão,
Pareces debulhar uma
oração,
A fim de que se
ilustrem teus pupilos.
Assim, ao dirigir-se
ao Criador
- Contrito, piedoso e
genuflexo -
Um companheiro teu
queda perplexo,
Pois defeso enxergar
quaisquer vacilos.
Se Régis és porque de
reis derivas,
Também maravilhas teus
convivas,
Porque és modelo,
personagem sã.
Notar muito me apraz
tua postura,
Teus procederes de
intenções mais puras
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