domingo, 10 de agosto de 2014

HISTORIETA - RESENHA (VM)

GERÚNDIOS DE VIVER E AMAR
 Acerca da Pessoa e de um Livro de
Carlos Fernandes Gurjão
Vianney Mesquita*

Não é o acaso, decerto, outra coisa senão o pseudônimo de Deus, quando Ele não quer assinar. (Theóphile Gautier, 1811-1872).

Em tempo bastante recuado, na metade da década de 1960, provei do agrado de travar conhecimento com o Dr. Carlos Fernandes Gurjão, ambos como discentes do Curso de Jornalismo para Principiantes (1), organizado e executado pela Professora Doutora Adísia Sá, sob os auspícios da ACI, antes se tornar o Curso de Comunicação Social, programa de graduação de grande prestígio da U.F.C., fundado por Adísia Sá.

Naquela ocasião, hoje assaz remota, experimentei da agradável companhia desta pessoa, na apreciação dos seus qualificativos intelectuais e lhaneza de tratamento, como jovem de educação esmerada, de futuro promissor, fato a se comprovar pouquíssimo tempo depois, quando o Dr. Gurjão se fez facultativo pelo Curso de Medicina da mencionada Academia.

Um lapso enorme, mais de quatro decênios, apartou nossa hígida e desinteressada convivência, cada qual tomando rumo próprio, sequenciando nossos misteres profissionais em espaços díspares, sem jamais nos avistarmos, mercê dos campos funcionais, distintos e distantes. Tal situação restou adjuvada pela evolução de Fortaleza, com inusitado crescimento demográfico e excepcional medrança social, ao ponto de se haver tornado a quinta urbe do País.

Conforme exprime o notável romântico francês Theóphile Gautier, certamente, a eventualidade não é outra coisa a não ser o pseudônimo do Criador, quando Ele não quer assinar. Isto porque, numa circunstância especial de havermos sido convidados (eu e minha mulher, Socorro Mesquita), por meu irmão – médico, como o Dr. Carlos Fernandes Gurjão – Fernando Antônio Mesquita, estivemos presentes ao Encontro Anual da Sociedade São Lucas, sodalício de facultativos católicos do Ceará, aberto a componentes das famílias dos associados, em 2008, ocorrido em Guaramiranga-CE.

Esse acaso nos depôs, novamente, em contato, evento venturoso para mim – o de reeditar a interrompida amizade.

Agora, pois, uma vez reformado por jubilação trabalhista – eu também – ele se entrega à contemplação das coisas do espírito, ao cultivar com inteligência e beleza estilística, além da religião, o texto-prosa e a poesia, fluxo espontâneo de poderosos sentimentos, cuja origem está na emoção relembrada na tranquilidade, consoante é magnificamente expresso pelo romantismo de William Wordsworth (Y 07.04.1770 – 23.04.1850), e a calhar muito bem na personalidade  do escritor sobre o qual escolio.

O autor de Vivendo e Amando, sem duvida, com a decisão de escrever, aflui à reflexão de Jean Richepin, médico militar (Argélia, Y 04.02.1849; 2.12.1926), para quem os poetas são pobres crianças, ao se distraírem fazendo bolhas de sabão com suas lágrimas, entendendo ser, ainda, a poesia a eles necessária, consoante sucede com todos os homens, pois quem não gosta de versos conserva um espírito seco e pesado, hajam vistas serem os versos, na realidade, a música da alma. E nisto o Dr. Carlos Gurjão é um virtuoso.

E a vida deste poeta – tranquila, cordata, amorosa e benfazeja – é vera poesia, a qual, na sua acepção ampla, é o antever de muito longe, o ousar denodado, o cravar os olhos no sol do ideal sem trepidar e ver no homem, tão claramente como o corpo pedindo pão e vestido, um espírito exigente de luz e um coração somente de amor refestelado, na exata configuração de Antônio Feliciano de Castilho.

De parabéns o autor e a literatura por mais esta produção, cujo influxo o leitor pode comprovar ao se regozijar com sua leitura.


(1) Fizeram, também, parte desse curso, além do Dr. Gurjão, os imortais da Academia Cearense de Literatura e Jornalismo, Paulo Maria Aragão e Antônio Vicente de Alencar.


*Vianney Mesquita 
 Docente da UFC 
Acadêmico Titular da Academia Cearense da Língua Portuguesa  
Acadêmico Emérito-titular da Academia Cearense de Literatura e Jornalismo 
Escritor e Jornalista

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