segunda-feira, 16 de março de 2020

CRÔNICA - Um Romancista Poético (ES)


Um Romancista
Poético
Edmar Santos*


Tantos sonhos sonhados, e desde menino trazidos guardados em cada passo andado pelas trilhas do sertão onde nasceu. Sol, parede de taipa, mandacaru; paisagem, que paisagem!

Violão desafinado, garganta que arranha a voz, traz canção de esperança:

/Já vou embora/
/Mas sei que vou voltar/
/amor não chora/
/Se eu volto, é pra ficar/

O coração se dividia entre o ir e o ficar. Fala, não tinha mais, o engasgo não deixava falar. Deixou o violão de lado, calou o lábio espremido; pegou caneta e papel e escreveu como em gemido, conversando com sua dor:


A verdade é que existem dois lados de um só coração. Como uma moeda em suas duas faces. De um lado o medo estampado, do outro a esfinge de paixão. Com ramos de louros que simbolizam vitória, mas que antes da glória, só existia solidão.

A verdade é que sem ela não se vive. Antes dela não tinha razão, hoje com ela é perigo, mas depois, com ela, tem canção.

A verdade é que pouco me importava com planos ou amanhã, com saudade e solidão. Hoje, tenho medo do medo que me dá em saber que sem ela não tenho chão.

Nada se desvia das avalanches que deslizam inesperadamente, e nos quer embalar para o vale. O cume, onde insiste a falta de sentir, impiedoso, menos oscila; vislumbra o descalabro do embrulho monte abaixo, em tudo misturando: neve e paixão; árvores e certezas; vegetação e confiança... Agora tudo é um turbilhão morro abaixo.

E lá no Vale o amor; sossegado e pacato, prestes a sentir toda a fúria desenfreada, inesperada e traumatizante, que descartará o organizado e previsível mundinho do 'Eu'.

Ah nada... que do nada, o nada faz, que refaz por refazer do nada, o nada trás; por querer que o nada não fosse nada, e nada mais”. E assinou de si para si, como se a única coisa que restasse fosse seu primeiro nome, Nélio.



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