NEVOEIRO E BAIXA VISIBILIDADE
Rui Martinho Rodrigues*
Os acontecimentos frenéticos da Lava
Jato, somados às diversas crises superpostas, afetando os campos econômico,
moral e político restringem a visibilidade necessária às conjecturas
prospectivas. Não sabemos, ao fim e ao cabo, quem sobreviverá; que novas
lideranças emergirão dos escombros; se agremiações políticas serão destruídas
ou sobreviverão; e quais serão as possíveis mudanças institucionais. Temos um
nevoeiro de baixa visibilidade na vida pública. Não sabemos se as instituições
sairão mais fortes ou fragilizadas. Os limites da judicialização da política,
inevitavelmente associado à politização do Judiciário, ainda não estão
definidos. Não sabemos sequer se a ordem jurídica e política sobreviverá.
Todos vislumbram uma faxina em regra.
Os novos meios de investigação de que dispõe a polícia técnica, seja na forma
de gravações, grampos, rastros eletrônicos de transações financeiras, abertura
dos sigilos bancários nos paraísos fiscais mediante precatório e,
principalmente, o direito premial, que oferece sedutoras oportunidades de
barganha, ensejando a quebra da “lei do silêncio” reinante nas organizações do
tipo mafioso. Apesar do nevoeiro, a corrupção certamente se tornará uma
atividade cujos riscos serão cada vez mais altos.
A visão maniqueísta da política
dividia os homens públicos e os partidos em dois grupos: o dos heróis virtuosos e o dos vilões. Agora parece destinada ao museu dos equívocos lamentáveis. Os problemas
nacionais podiam ser solucionados pela vontade política, mas o voluntarismo não foi
suficiente. Equívoco ou falta de vontade virtuosa?
Vislumbramos ainda, em meio ao denso
nevoeiro, dias mais difíceis para as promessas de milagre econômico,
entendendo-se como tal o aumento da renda sem aumento da produtividade; consumo
sem renda, baseado sobretudo no endividamento; gastos públicos crescendo mais
rápido do que a economia; e investimento sem poupança. O aparente sucesso
realizado nestas circunstâncias, na forma apresentada como crescimento da
classe média e do consumo de bens e serviços, conforme demonstrado pela
profunda crise assim produzida, não tem sustentação, não se mantém a médio
prazo.
Não existe almoço de graça, conforme
adverte o mestre de Chicago, Milton Friedman. É possível que, pelo menos por
uns tempos, fique mais difícil enganar a muitos por todo o tempo, embora
certamente continuará possível enganar alguns todo tempo, como diria Lincoln.
Fala-se, com temor, na possibilidade do
advento de um aventureiro, que ocuparia o espaço deixado pelas lideranças e partidos
desmoralizados.
Personalidades que se tornaram notórias no cumprimento do
dever, combatendo a corrupção no exercício da judicatura, seriam os possíveis
estranhos no ninho da política: juiz Sérgio Moro e o ex-ministro Joaquim
Barbosa são os nomes mais lembrados nas cogitações desta linha de raciocínio.
Não existem indícios, até agora, de que as personagens citadas se encaminhem
para a política. Nem é certo que seriam imbatíveis. Mas
se o fizerem dentro do jogo democrático não há o que recriminar.
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