terça-feira, 21 de junho de 2016

ARTIGO - A Calamidade e a Festa (RMR)

A CALAMIDADE E A FESTA
Rui Martinho Rodrigues*


O governo fluminense decretou calamidade no Estado. A justificativa é a condição das finanças. O citado governo pede ajuda federal. Um dos motivos pelos quais a ajuda federal é apresentada como necessária, justificando tratamento diferenciado em relação às demais unidades federadas em situação igualmente difícil, é a realização dos jogos olímpicos na “Cidade Maravilhosa”.



A situação é de calamidade e promove-se uma grande festa. Os jogos olímpicos constituem um grande festejo, digno dos reis e potentados da Antiguidade ou da Idade Média, embora possam promover o turismo e deixar algum legado útil, caso estes não se convertam em elefantes brancos a exemplo da Copa Mundial de Futebol de 2014.

Outros estados enfrentam dificuldades financeiras, mas não estão promovendo um grande espetáculo, com muitos convidados internacionais. Não merecem a mesma ajuda, segundo a lógica do governo fluminense.



Os estados federados estão endividados. A União não se encontra em melhor situação. Os governos municipais, em sua maioria, também estão à beira da falência. Grande parte das empresas e consumidores enfrentam situação semelhante. A saída seria promover grandes festejos internacionais?



Não se fala em cancelar o grande espetáculo, sem embargo de alguns países terem se oferecido para receber o evento. A honra nacional cairia na lama, caso aceitássemos a transferência dos jogos em apreço. A mesma honra não sofre nenhum respingo se os nossos serviços de saúde, educação, segurança pública e tantos outros entrarem em colapso, principalmente se a falência dos serviços essenciais se der longe das vistas dos turistas, que ficarão circunscritos ao Rio de Janeiro.



O argumento para discriminarmos entre estados falidos, favorecendo o Rio de Janeiro, é o turismo e a imagem a ser projetada no exterior. Não se pensa nas atividades essenciais, que também contribuem para o aquecimento da economia. Investir em saúde pode melhorar a produtividade da força de trabalho, aquecer o setor de serviços e a indústria ligada à respectiva atividade. O setor de transporte, com ênfase na mobilidade urbana, pode diminuir o custo dos fretes, atenuando o chamado custo Brasil.

O turismo sofre os efeitos da sazonalidade, gerando empregos temporários, além de guardar relação com todos os problemas inerentes ao trânsito de pessoas, do que a circulação de doenças é apenas um exemplo.

Iludimo-nos com as cifras milionárias do turismo na França, na Itália e outros lugares. Esquecemo-nos de que estes campeões de atração de visitantes têm bons serviços essenciais, podendo investir em turismo sem que para tanto tenham de abandonar hospitais e outras prioridades. 

Desconsideramos a posição geográfica e a riqueza do patrimônio histórico, artístico e cultural da Itália, da França e mesmo do México, com um potencial de atração que nos falta. Não somos tão próximos de sociedades tão ricas. Não temos tanta História e a que temos não preservamos. O turismo sexual tem sido o veio explorado no Brasil. Será este o objetivo? 

Não se pense que eventos com obras milionárias sejam oportunidade para roubalheira.



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