quinta-feira, 5 de maio de 2016

CRÔNICA - Trabalho Hercúleo (RV)

TRABALHO HERCÚLEO
Reginaldo Vasconcelos*


Para mim, pessoalmente – e eu posso confessá-lo porque não faço parte da Comissão Especial do Impeachment – o processo jurídico-político que transcorre no Congresso contra a Presidente da República não visa exatamente demitir Dilma Rousseff, por isso ou por aquilo.  

Quem aperta o botão de uma campainha precisa fazê-lo, mas pelo efeito desse ato, e não simplesmente pelo prazer de acionar o dispositivo elétrico, ou de ouvir o som remoto que provoca. O objetivo real de quem toca uma campainha é se anunciar e convocar alguém que o atenda.

Tenho assistido longamente a um grupo “empoderado” pelo mito ideológico, pelo voto da grande massa crédula conduzida pela falsa mágica de Caramuru, pela distribuição barata de espelhinhos e miçangas, pela maquiagem de índices, pela flagrante propaganda enganosa – e com sufrágios contados por máquinas venezuelanas suspeitosas.

Feito o aparelhamento da República, o grupo cooptou o congresso com favores, e foi tentando controlar o Judiciário e o Ministério Público com indicações de Procuradores e Ministros, conforme o líder Lula da Silva confessou em ligações interceptadas. Os que não protegessem os interesses espúrios do Governo seriam “ingratos” e “covardes”.

Na sequência, o grupo se mancomunou com as empreiteiras do Governo – não mais concorrentes entre si, mas agora reunidas em um sindicato do crime – para que essas empresas superfaturassem os contratos firmados com as grandes estatais e repassassem o sobrepreço aos partidos políticos do conluio, em boa parte por meio de doações oficiais de campanha, mas também via “caixa dois” a parlamentares, a marqueteiros, e a servidores públicos acumpliciados pela gangue, por meio de doleiros operadores dos “esquemas”.

Na verdade, Dilma Rousseff, com a sua incompetência, sua arrogância, sua conduta aloprada, expôs o calcanhar do Aquiles malévolo que oprimia esta Nação;  cortou as madeixas de um Sansão cretino que sodomizava o povo brasileiro; enfim, libertou o Hércules da cidadania para que ele pudesse realizar os seus doze e difíceis trabalhos, para livrar o País do jugo de uma Hydra terrível e odienta.

Sendo assim, muito pouco me interessam as razões jurídicas articuladas pela acusação e pela defesa de Dilma Rousseff, desde que prevaleça e sobressaia no julgamento o legítimo interesse nacional, que está muito ao largo da sanha do Governo em se manter no poder, com mais de vinte mil servidores graciosamente nomeados, e com um sem número de políticos governistas alcançados pelas tenazes da Justiça.

A ampla causa de pedir expressa na denúncia original foi reduzida e tornada excessivamente angusta pelo ínclito Presidente da Câmara dos Deputados – ato inexplicável, mas abonado por um “bravo” Ministro do Supremo Tribunal Federal.  

Então, diante desse quadro, demitir Dilma Rousseff da Presidência da República, por qualquer pretexto jurídico, corresponde unicamente a tocar uma campainha – mas, neste caso, não meramente para acionar uma sirena, visando obter a amistosa atenção de um atendente. Demite-se Dilma Rousseff para fazer explodir uma máquina administrativa degenerada que sugou a Nação por treze anos, que levou à falência suas contas públicas, sacrificou a indústria e o comércio, degradou os benefícios sociais criados meramente para captação de sufrágio na imensa e ignara base da pirâmide social, trouxe vergonha ao Brasil e o expôs ao ridículo no cenário mundial.

Mas, como jurista, ainda considero que as chamadas “pedaladas fiscais” e a edição de decretos orçamentários desautorizados são suficientes para a condenação da Presidente. Basta notar o leigo em Direito o padrão pouco técnico a que recorreu a sua defesa, fazendo comparações pueris entre a Fazenda Pública Federal e a lista de compras de quem vai ao supermercado. Pior do que isso, é absurda a alegativa da defesa de que o processo se deve a ato de vingança do Presidente da Câmara, que apenas o recebeu e deu seguimento – e ainda reduziu a causa de pedir, por razão pessoal inconfessável.

Mais grave ainda, a defesa diz que a Presidente é inocente porque outros fizeram o mesmo no passado – o que não justificaria nada, ainda que isso fosse verdade –  e, por fim, defende que a Presidente da República não tem responsabilidade sobre condutas administrativas gravíssimas no Governo Federal, envolvendo bilhões de reais, pois a culpa seria somente dos ministros das finanças.

Porém, o mais patético em todo o processo foi a participação do velho advogado Marcelo Lavenère, ex-presidente da OAB, autor do pedido de impeachment do  então presidente Collor de Mello, militante de esquerda veterano, que foi convidado pelo Governo a se pronunciar como especialista na matéria.

Coitado! Ele me lembrou aquele soldado japonês, Shoichi Yokoi, que durante a Segunda Grande Guerra, em 1944, instalou-se numa caverna no meio da mata para não se render ao exército americano, que invadira a ilha de Guam. Ao ser encontrado, 27 anos depois do fim do conflito, o velho soldado ainda estava fardado e dizendo “banzais” a um derrotado e rendido imperador Hirohito, de um Japão já então americanizado.

Alguém precisa informar ao nobre e cavernoso colega que a União Soviética fracassou, que o muro de Berlim foi demolido, que a China é hoje um dos maiores polos capitalistas deste mundo. Que os irmãos Castro capitularam, e que hoje estão de braços dados com o Presidente Barack Obama, recebendo shows de rock e desfiles de moda americanos. 

Estaria a paupérrima ilha de Cuba sofrendo um retrocesso ao aceitar o capitalismo, para matar a fome do seu sofrido povo e o inserir no Século XXI? 

Enfim,  poderia o ínclito colega Marcelo Lavenère resgatar o Popó, personagem memorável do nosso saudoso Chico Anysio, que não se libertava do passado. Eu vou mandar um cabograma perguntando o que o companheiro Mao Tsé-Tung acha disso!.

           

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