domingo, 25 de setembro de 2016

ARTIGO - O Polígrafo Linhares Filho (VM)



O ORTÔNIMO,
OS HETERÔNIMOS E
A OUTRA COISA, NA CALIGRAFIA DO POLÍGRAFO LINHARES FILHO
Vianney Mesquita*

O que penso do mundo?
Sei lá o que penso do mundo!
Se eu adoecesse pensaria nisso.


[Alberto Caeiro – heterônimo de PESSOA, FERNANDO Antônio Nogueira de Seabra  – *Lisboa, 13.06.1888; +Lisboa (Jerônimos), 30.11.1935].


Procedia a uma regulagem nas minhas (como eu) desorganizadas estantes, quando divisei A Outra Coisa na Poesia de Fernando Pessoa, do escritor polimático Linhares Filho, professor titular de Literatura Portuguesa da U.F.C. mestre nesta linha investigativa (Pessoa) e doutor no mesmo veio (Miguel Torga).

José Linhares Filho, de quem experimentei o prazer de assistir ao lançamento do broto intitulado Junto à Lareira Invisível, há poucos meses, é lavrense (da Mangabeira), como ocorrem ser Dimas Macedo, Batista de Lima, Josafá e Joel Linhares e Joaryvar Macedo, bem assim muitos autores de renome, procedentes desta fonte prolígera de pessoas de letras, cultura e ciência.

Tanto em razão de sua diversa e qualificada produção na poesia, ensaio e noutros gêneros de escritura, como, em particular, em decorrência dos estudos empreendidos em profundez acerca de Pessoa e Miguel Torga (Adolfo Correia da Rocha), LF é produtor apreciado, estudado e policitado no Brasil, Portugal e nas várias nações lusofônicas, razão por que constitui nome de referência terciária no ecúmeno literário nacional e mesmo ultrapassando os limiares patriais do idioma português.

Na releitura do mencionado clássico da ensaística literária, restou mais cristalina ainda (a leitura repetida tempos após é procedida sempre noutra perspectiva) a ideia de que descobrir lances novos, por exemplo, na produção de literatos da grandeza de Machado de Assis, Eça de Queiroz, José de Alencar, Fran Martins ou Fernando Pessoa não constitui labor no alcance das pessoas comuns, porquanto, se pensa, desarrazoadamente, suas obras já restam eficientemente dissecadas pelos mais eminentes analistas.

Desta sorte, depreende-se a noção de que a Arte, na sua acepção melhor, não é tão estreita ao ponto de se esgotarem valores latentes, e sempre haverá no seu recôndito entretons ainda intocados e que somente poderão ser devassados pela argúcia do estudioso exigente e fiel à pesquisa para descodificação perfeita da mensagem.

A Outra Coisa na Poesia de Fernando Pessoa, ora apreciada com visão renovada, diversa da leitura inaugural, não constitui, decerto, um livro a maior na bibliografia passiva do Lisbonense notável, conforme se poderia erroneamente supora priori, pois LF percorre intimamenteo discurso admirável do Poeta luso e, sine ira et studio, no frasear de Públio Cornélio Tácito, imagina, supõe, fotografa, conclui e explica, com a clareza do bom tradutor, as diversas facetas da obra do Autor de Mensagem.

Linhares Filho estabelece as relações entre o ortônimo e os heterônimos Alberto Caeiro, Álvaro de Campos e Ricardo Reis; exprime singularmente as posições de Caeiro e Reis, bem assim o relacionamento de Campos-Caeiro; formula coerentemente as soluções idealista e realista no contexto pessoano, explicando, no que chamou solução realista, o infinito de Pessoa, o impossível de Reis e o realismo de Campos.

Linhares Filho, pois, no volume sob comento, deu continuidade ao seu fado de excelente escritor de ensaios, garantindo um lugar de destaque no concerto da crítica especializada; e, ao demostrar a personalidade multíplice do Escritor de Primeiro Fausto, arremata com o enfeixe maior de Pessoa – o empenho deste em compreender o mundo e atingir o ser.

O experimento literocientífico sob exame, por conseguinte, malgrado assunto espreitado amiúde por teóricos de toda parte, é uma vertente exata para quem tencionar proceder a incursões mais demoradas pela obra de Fernando Antônio Nogueira de Seabra Pessoa, em decorrência da absoluta originalidade das suas proposições.


Glória e paz e parabéns e vida longa ao excelso ensaísta e enorme cristão, ocupante de uma cadeira (a de Luís Antônio da Rocha Lima) na Academia Cearense de Letras, o lavrense José Linhares Filho!


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