terça-feira, 2 de maio de 2017

CRÔNICA - Tudo Outra Vez (AMC)


Tudo outra vez *
Antonio Mourão Cavalcante**



Belchior, poxa cara! Deu uma saudade lascada essa semana. Pois não é que passei estes dias cantarolando “Tudo outra vez”... Há tempo, muito tempo, que eu estou longe de casa.” E uma vontade danada de conversar. Papo sem pauta. Descosturado. Lembrando os amigos. Feito uma chamada escolar. Dizendo, meio triste, meio sem jeito: “Este aí, separou-se... Fulano morreu. Um câncer brabo. Foi bem ligeirinho! Sicrano deu-se bem na vida. Ficou rico. É dono de hospital!”.

Sei que andaram fazendo uma zorra doida com a sua vida. Foram lhe descobrir no Uruguai. Depois você sumiu de novo... Tento localizar-lhe no Google Notícias, agenda... e nada!

Nem queria esse Belchior de muita fama. Glamour e paetês. Pensava no Belchior da cantina da Farmacologia, onde o cantineiro – no maior gesto de construção da paz – naquela época, botou em seus filhos gêmeos, os nomes de Kennedy e Kruschev. Eram tempos da guerra fria.

Voltando à cantina. Lá, na segunda-feira, ocorria a avant-première das composições que jorravam de sua guitarra. Éramos os primeiros ouvidos e aplausos. “No Corcovado quem abre os braços sou eu!”.

Igualmente surreais as histórias do convento capuchinho que você tinha acabado de frequentar e sair. As normas e os costumes dos frades que ainda guardavam raízes nos tempos medievais.

Havia, no que vivíamos, muitas histórias e Histórias. Sonhos e um profundo desejo de construir o mundo utópico e diferente. Éramos razoáveis. Exigíamos o impossível.

Depois foi a diáspora. Cada um seguiu seu rumo. De tempos em tempos, tínhamos encontros e notícias recíprocas. De longe a gente ia construindo a vida, no possível.

Hoje é domingo. Domingo em casa. Domingo no mundo. Fui mexer em uns velhos CDs, quase empoeirados. Ouvindo estas músicas, despertou-me esse desejo de reencontro.

Talvez, nesse domingo sem sol e sem mar, desejasse apenas dizer que continuamos vivos e acreditando que a felicidade é ainda este alimento que nos move, na esperança...

* Esta crônica, tem algum tempo, foi publicada no Jornal O Povo.



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