quinta-feira, 6 de novembro de 2014

ARTIGO (RV)

DESEDUCAÇÃO VIDEOGRÁFICA
Reginaldo Vasconcelos*

Homossexualidade não é crime no Brasil, e não é mais considerada doença, segundo concluiu em 1990 a Organização Mundial de Saúde, razão pela qual a palavra perdeu o sufixo “ismo” (homossexualismo), que indica patologia em uma de suas acepções semânticas, e ganhou a desinência “dade”, que refere simplesmente  ao modo de ser da pessoa, como uma característica natural.

Mas as inversões sociais daquele gênero zigótico que cada indivíduo tem de berço ainda não adquiriram o status jurídico necessário para coibir e punir as aversões sociais e fobias pessoais que despertam, tendo em vista que muitas das igrejas cristãs ainda consideram pecaminosas as formas de transgeneralidade sexual, em quaisquer de seus graus e vertentes.

Sendo assim, se criminalizada a chamada “homofobia”,  isso afetaria de forma severa os preceitos religiosos, entrevistos na liberdade de culto, de modo que as bancadas de índole evangélica, que hoje são bastante poderosas no Parlamento brasileiro – respaldadas por um imenso eleitorado – não viabilizam iniciativas legislativas que estabeleçam esse novo tipo penal.

Não sendo crime, nem doença, a homossexualidade também não é opção, da mesma forma que os anões não optaram pela baixa estatura, nem os gigantes pelo seu crescimento excepcional. Sendo assim, tampouco pode ser pecado, mas contingência psíquica, ou hormonal, que independe da vontade.

Prelados da Igreja Católica têm propalado que a instituição nada tem contra os homossexuais, porém condena o homossexualismo, como quem diz que acata os pobres enquanto deplora a pobreza, ou como quem repele as drogas ilícitas sem desprezar os viciados.

Mas no Brasil o homossexualismo tem sido objeto de intensa campanha de “educação videográfica”, quando as novelas da Rede Globo de Televisão, de imensa penetração popular, têm explorado o tema à exaustão, no desiderato claro de lhe ampliar a aceitação geral.

Aliás, de uma das versões do reality show Big Brother Brasil saiu um dos maiores líderes nacionais do movimento LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais e Travestis), o atual Deputado Federal Jean Wyllys, pessoa de conduta moral impecável, de excepcional lucidez e dignidade inquestionável.

Wyllys, posto que defenda as prerrogativas da sua classe, dando seu próprio exemplo de equilíbrio e sobriedade, é infenso à imagem caricata que outros homossexuais assumem, quando se entregam a prostituição degradante pelas esquinas e alimentam o prosaico, o ridículo, o exibicionismo insano em grandes festivais e passeatas.

A propósito, a Rede Globo exibe no momento um de seus folhetins, ambientado no Rio de Janeiro em tempos atuais, de cuja trama faz parte um leque variegado de tipos de homossexuais masculinos. O autor, Agnaldo Silva, evidencia assim que esse fenômeno pode e deve ser tratado com naturalidade, em seus aspectos sociais mais graves, suas expressões bem humoradas, com exemplares mais éticos e outros de caráter deplorável.

Trata-se da novela Império, que tem um bissexual casado e pai de filhos, que se mantém no "armário" social, representado pelo ator José Mayer, até então o maior ícone de masculinidade da teledramaturgia brasileira, afrontando nesse papel o seu fisic du role do machão avalentoado; um gay maneiroso e afetado, extremamente mau-caráter, vivido por Paulo Betti, que vilipendia a todos em seu blog na Internet; um negro cabeleireiro transgênero extremamente efeminado, pessoa de elevada virtude moral, estrelado magistralmente pelo impagável Aílton Graça.

Mas, no roteiro desta novela, enquanto a TV Globo faz um trabalho “politicamente correto” na luta contra o preconceito e o sexismo social, ao mesmo tempo  resvala gravemente na deseducação jurídica do povo. Não obstante se tratar de obra ficcional, não custa nada usar a dramaturgia popular para prestar serviço cultural à sociedade.

O novelista trata um crime de difamação como sendo de calúnia, criando uma situação judicial totalmente equivocada. E concede ao difamador, personagem de Paulo Betti, a prerrogativa da “exceção da verdade”, com direito de provar em Juízo que sua vítima, conforme ele propalou criminosamente na mídia eletrônica, é de fato homossexual.

Ora, a calúnia se configura quando se atribui algum crime a alguém, e não consegue prová-lo. Já a difamação é um ataque público contra outrem, relativamente à sua honra e à sua intimidade, e esse tipo de delito não admite que o criminoso faça prova. Por outro lado, em ambos os casos, a simples retratação pública e espontânea do réu elide a sua punição penal, ainda que a vítima não queira aceitar as desculpas e não queira perdoar o querelado. Enfim, estando incontroversa a conduta criminosa, e, não havendo o arrependimento posterior, não há defesa possível para o caluniador ou difamador. 


*Reginaldo Vasconcelos
Advogado e Jornalista
Titular da Cadeira de nº 20 da ACLJ 

           

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