domingo, 30 de novembro de 2014

ARTIGO (RMR)

O PERFIL DO ELEITORADO
Rui Martinho Rodrigues*

Programas de governo ausentes ou tardiamente apresentado; alianças sem vinculação programática; defesa da manutenção e ampliação das políticas sociais; juras de defesa das empresas estatais foram comuns aos candidatos viáveis. Todos propunham uma campanha propositiva e respeitosa. Mas a semelhança levou à guerra.

O eleitorado apresentou-se diferenciado. Partidários da heterodoxia econômica colidem com a ortodoxia, definindo uma das linhas divisórias do eleitorado. Prevaleceu a heterodoxia: desenvolvimentismo e benefícios sociais “não precisam de sustentabilidade financeira”.

O populismo é simpático. Quem recebe um benefício não raciocina que aquilo tem um preço. O passe livre no transporte público é benefício imediato. Quem se transporta sem pagar diretamente, não percebe que paga sem saber o quanto, nem a quem. Mas fica satisfeito. Pensa que o ônus recairá sobre terceiros. É um espertalhão atrapalhado.

Crescer sem investimento, escolarizar sem aprendizado, consumir sem renda, contrair empréstimos e não pagar: eis a heterodoxia econômica. O pensamento mágico é o combustível do autoengano, explorado pelos publicitários e políticos. A sonegação de informações sobre o recrudescimento da pobreza (o IBGE foi proibido de divulgar o fato até que as eleições passassem), contabilidade criativa (eufemismo para fraude contábil) e a apresentação da preocupação com a sustentabilidade financeira como maldade imperaram nas campanhas e na percepção dos refratários à realidade. A obstinação equivocada é apresentada como inconformidade virtuosa e heroica.

Preservação ambiental e desenvolvimentismo definem outra linha de separação dos eleitores. Entre o desenvolvimentismo predatório e o preservacionismo paralisante pode-se identificar uma posição intermediária: os defensores do manejo racional e sustentável do ambiente.

O multiculturalismo diferencialista é o marco mais agressivo das fronteiras políticas. Negar o interativismo, prometer uma preservação de raízes culturais indiferente ao tempo e às interações entre culturas, satanizando as transformações culturais mútuas é o discurso raivoso neste campo. A exploração de ressentimentos e do “coitadismo” é grande apelo da exploração política.

A probidade administrativa também divide o eleitorado. Defender o erário contra o uso político do dinheiro público e o enriquecimento ilícito, para uns, é dever cívico e é honradez. Para outros é manifestação da moral burguesa.

A moral sexual e a defesa da vida do nascituro é o mais novo limite entre grupos políticos. Uns apresentam a moral tradicional como preconceito e como patologia psiquiátrica (fobia). Outros formulam juízo moral sobre condutas, expressando valores de tradições milenares, alegando que formulam conceito sobre algo conhecido, não cabendo a designação de pré-conceito.

O artifício de confundir juízo de valor com preconceito e com patologia psiquiátrica tem prevalecido.

Assim caminha o eleitorado.


*Rui Martinho Rodrigues
Professor – Advogado
Historiador - Cientista Político
Presidente da ACLJ
Titular de sua Cadeira de nº 10

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