COLHENDO O QUE PLANTAM
*Reginaldo
Vasconcelos
Estabeleceu-se uma
grande polêmica jurídica no país, com forte interferência política, em torno da
decisão judicial que nega trabalho externo ao condenado José Dirceu, e prisão
domiciliar a seu comparsa, José Genuíno.
O Ministro Joaquim
Barbosa, Presidente do Supremo Tribunal Federal, relator do processo do “Mensalão”,
resolveu aplicar a literalidade do art. 37 da Lei das Execuções Penais, que diz
o seguinte, exatamente: “A prestação de
trabalho externo, a ser autorizada pela direção do estabelecimento, dependerá
de aptidão, disciplina e responsabilidade, além do cumprimento mínimo de 1/6
(um sexto) da pena”.
O parágrafo único do
mesmo artigo ainda arremata: “Revogar-se-á
a autorização de trabalho externo ao preso que vier a praticar fato definido
como crime, for punido por falta grave, ou tiver comportamento contrário aos
requisitos estabelecidos neste artigo”.
Como se percebe
claramente, essa prescrição legal estipula um requisito objetivo – o
cumprimento de um sexto da pena cominada, e diversos critérios subjetivos, que
vão desde a mera autorização da direção do presídio, até a aferição da aptidão,
da disciplina e da responsabilidade do preso.
Assim, com base na
letra da lei, tudo pode ser arguido para denegar a pretensão de um preso ao
benefício do trabalho externo, que cumpra qualquer regime de prisão. Um mero
diretor de presídio pode obstar esse pleito, até porque disciplina,
responsabilidade e aptidão só podem ser aferidos por critério muito pessoal.
Isso faz intuir que o
trabalho externo do preso não é um direito certo, mas um privilégio eventual de
quem desfrute do beneplácito dos responsáveis pela execução da pena, do
carcereiro ao magistrado. Não há como se interpretar de outra maneira.
É verdade que, até
para reduzir a densidade prisional, os juízes das varas especializadas têm considerado
que a exigência do cumprimento de um sexto da pena (que autoriza a progressão
do regime fechado para o regime semiaberto), requisito já cumprido pelos que vieram do
regime fechado, já esteja superada para os que sejam condenados apenas a
cumprir a punição mais branda. Mas isso não vincula os juízes que tenham outro entendimento.
Esclarecendo: Se
alguém é condenado ao regime fechado,
com um sexto da pena ele progride para o semiaberto, e então, obviamente, logo
que progrida, terá direito ao trabalho externo, imediatamente. Vejamos o que diz o art. 112 da mesma Lei das
Execuções Penas:
“A pena privativa de liberdade será executada
em forma progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, a ser
determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos um sexto da pena
no regime anterior e ostentar bom comportamento carcerário, comprovado pelo diretor
do estabelecimento, respeitadas as normas que vedam a progressão”.
Acontece que o réu
pode ter sido condenado ao regime semiaberto, como é o caso de José Dirceu, de
modo que, realmente, ele precisaria cumprir pelo menos um sexto da pena, para
ter o direito de trabalhar fora da prisão. Claro, pois ele não progrediu do
regime fechado, de modo que não supriu essa condição temporária da lei para a obtenção
do benefício.
Todavia esse raciocínio é pessoal, e mais pessoal ainda é a definição da aptidão, da disciplina e da responsabilidade do preso, feita pelo juiz a quem cabe conceder o benefício. Se um preso comum, por exemplo, faz ameaças visuais ao juiz, ao promotor ou a suas vítimas, durante o julgamento, encarando-os fixamente (o que é comum acontecer), isso pode ser o bastante para que os seus coatores legais não vejam com bons olhos os seus pleitos posteriores.
É o momento de lembrar
que os presos do mensalão contestam publicamente a lisura do julgamento, por si
e por seus partidários; fizeram gestos de rebeldia ao serem presos, por si e
por seus partidários; e recebem ofertas de emprego de entes privados
sabidamente alinhados com o partido político a que serviram – e que, por seu
turno, continua lhes sendo solidário.
Diante disso, claro
que a interpretação bonançosa da lei poderia parecer capitulação do STF às
pressões institucionais. Mas essa capitulação acabará acontecendo, no julgamento de um
recurso ao Plenário do STF, hoje integrado por ex-advogados simpatizantes do
partido.
*Reginaldo Vasconcelos
Advogado e Jornalista
Titular da Cadeira de nº 20 da ACLJ
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