O FOGO E A FORTUNA
Reginaldo Vasconcelos*

Em prosa agradável, vazada em escorreito
português, aplicando linguagem clara e feminina, a Benemérita da ACLJ (entidade que ela cita por duas vezes) relata pari passu a sua trajetória de
vida, desde a infância até a sua provectude, referindo gentes e fatos da vida
cearense que ocorreram em seu entorno, grande parte deles superficialmente conhecidos dos
fortalezenses mais antigos, por ela tratados no livro de maneira arguta e delicada.

A segunda agonia que me torturava era a
impossibilidade absoluta de ler aquele livro para oitiva do meu pai, falecido
em janeiro último, ele que foi contemporâneo de todos os personagens referidos,
vizinho de Dona Yolanda e Edson Queiroz no passado, amigo dele na juventude,
sócios em uma empresa transportadora, nos anos cinquenta.

Destaque para o início das dores do parto
da primeira gravidez, no confessionário, reveladas de repente ao padre
confessor, que a mandou ir para casa incontinenti, e a angustiosa demora da
dentição do primeiro filho, contornada socialmente com a utilização de uma
mimosa e pequenina dentadura, até que o primeiro dente de leite despontasse.

Mas a grande força da obra está principalmente
na narração minuciosa da escalada entre a classe média e a fortuna
financeira, empreendida pela família da autora, revelando a descomunal
disposição para o trabalho e a imensa aptidão para os negócios que
caracterizavam Edson Queiroz.
Edson, a princípio, não parava de comprar e
vender, de farejar dinheiro, de perseguir lucros, de reunir capital, de
procurar talentos para a ele se associarem nos melhores ramos de negócios, abandonando
os que fracassavam e imediatamente tentando outras empresas.

Faço uma analogia perfeita com o homem primordial
que, para sobreviver na natureza, dando um salto evolutivo, friccionava pedras
em busca de fagulhas, reunia gravetos e soprava brasas para acender
uma fogueira, sem descanso e sem trégua, até obter as labaredas da fortuna.

Edson queria vencer e fazer fortuna, mas
entendia que ao empreender estimulava a economia, produzia riqueza econômica
difusa, com benefício científico e cultural, o que aproveitava à sociedade, à cidade, à região. Prosperar era para ele uma compulsão irrefreável, num afã de ser uma pessoa jurídica gigantesca, e cada vez maior, para servir à cidadania.

Mas nada se equipara à perda súbita e trágica do companheiro idolatrado, que ela acreditava ser invencível e imortal. Por fim, a confissão de
que, aos 87 anos, pretendia viver por mais uns dez, o que evidentemente não
estava nos planos de Deus, que lhe concederia mais uns doze meses, tão-somente.

Era feliz Dona Yolanda em suas viagens regulares ao Rio de Janeiro, a Paris, a Nova Iorque, a países exóticos, entre velhas amigas e bolhas de champanhe, sua bebida preferida. Era feliz em sua casa, com a efervescência das crianças da família – os filhos e, em seguida, os netos e os bisnetos.

COMENTÁRIO:
O
livro de D. Yolanda, de que li apenas parcialmente, minha sogra está
adorando, porque fala da Fortaleza da juventude dela.
O
estilo é leve, direto, de fácil compreensão. Onde é possível substituir uma
vírgula por um ponto, D. Yolanda não perdoa. Isso cria períodos curtos, vale
repetir, leves e de fácil compreensão.
A
narrativa linear, e na primeira pessoa, dá um tom intimista e convida a um
passeio pela estrada do tempo, (re)vendo uma cidade que já não existe,
encontrando pessoas que já se foram, contemplando valores aposentados pelas
novas gerações, admirando costumes postos no ostracismo.
Rui
Martinho Rodrigues
Gostaria muito de ter acesso a esse livro...
ResponderExcluirPode me ajudar?
Tem na biblioteca da Unifor, apenas para empréstimo. Recomendo muito a leitura, é maravilhoso.
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