quarta-feira, 3 de fevereiro de 2016

CRÔNICA - Fuja Deles! (HE)

FUJA DELES!
Humberto Ellery*

Se algum de vocês costuma dormir “só mais um pouquinho” de manhã cedo, e por conta disso toma o café da manhã “nas carreiras” antes de pegar o carro e voar para o trabalho, vou dar uma “dica” preciosa.

Se você já sai da garagem buzinando, acelerando e freando alucinadamente, tudo bem, o importante é não se atrasar para o trabalho.

Mas um cuidado se faz necessário, e aí vai a dica: Se o carro na sua frente tem no vidro traseiro o desenho de um crucifixo, ou uma imagem de Nossa Senhora, ou ainda uma daqueles frases tolas “Deus é fiel”, “Jesus te ama – e eu também”, ou qualquer sinal que o identifique como sendo o carro de um cristão fervoroso, aí é preciso ter cuidado, pois sua viagem vai se tornar um tormento.

Em primeiro lugar, esse pessoal só “anda se arrastando”. Eles não ultrapassam nunca o limite de velocidade, não adianta buzinar, piscar faróis, gesticular, nada os faz se apressar.

Eu acho que eles estão acostumados a sair para suas missas ou cultos muito antes da hora (pra pegar um lugar bem na frente na Igreja) e por conta desse hábito (totalmente fora da realidade do mundo de hoje, de velocidade, agilidade e decisões rápidas), pegaram a mania de sair sempre com bastante antecedência para seus compromissos, por isso podem se dar ao luxo de dirigir calmamente, tranquilamente, como se o mundo pudesse esperar. São uns idiotas!

Se o sinal amarelar, pare imediatamente, para não bater na sua traseira, porque aquela aceleradazinha básica para pegar o “finzinho” do sinal amarelo está totalmente  fora de cogitação. Ele vai parar. Avançar o sinal vermelho então, nem pensar, mesmo que não venha carro na rua transversal.

Um absurdo! Se a película do vidro não impedir sua visão tente observar se seus lábios estão se mexendo, e, em caso positivo... aí encrencou de vez: ele estará cantando algum “bendito” (no céu, no céu, com minha mãe estarei...).


Caso seu stress atinja um nível insuportável, jamais grite para ele “seu filho dessa, seu filho daquela”, “vai praquele lugar”. E se você, ainda por cima, exibir-lhe seu dedo médio (o popular cotôco), prepare-se para uma reação terrível que vai lhe tirar do sério: ele vai exibir um sorriso de beatitude, tremenda cara de “Mané, e vai erguer seu polegar em sinal de “positivo”, ou então, o que é ainda pior, vai traçar no ar com a mão um sinal da cruz e vai dizer: “Deus te abençoe meu irmão”.

Nessa hora, “meu irmão”, você sofrerá uma forte descarga de adrenalina, que vai provocar um estreitamento das coronárias, vai ter seus batimentos cardíacos acelerados, elevação súbita da pressão arterial, podendo advir inclusive uma forte dor de cabeça. É mole? Tudo por causa de um abestado que vai na sua frente atrapalhando sua pressa legítima de chegar ao trabalho na hora.

Portanto a minha “dica” é a seguinte: Se o carro na sua frente tiver as características descritas, mude de faixa, ou melhor, altere seu trajeto e siga por outra rua, pois esses caras são terríveis.

FUJA  DELES!!!!!




Nota do Editor:

A ironia é um idioma cerebral que perpassa todas as línguas faladas no Planeta, e que confunde o falante de qualquer delas que não perceba sua lógica.

O autor dessa crônica domina como ninguém a arte de dizer subliminarmente o contrário do que parece estar dizendo, usando o sarcasmo para denotar o que é insensato e o que é ridículo.

A um só tempo, ele, que é católico convicto, que conduz o veículo com vagar e cautela, ironiza a um só tempo duas castas de patetas do trânsito – os que buscam proteção divina fazendo inscrições místicas no carro, e os que fazem do trânsito urbano uma guerra de nervos cotidiana.
   


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