AI
DE TI, BRASIL
Arnaldo Jabor*
Arnaldo Jabor*
Ai
de ti, Brasil, eu te mandei o sinal, e não recebeste. Eu te avisei e me
ignoraste, displicente e conivente com teus malfeitos e erros. Ai de ti, eu te
analisei com fervor romântico durante os últimos 20 anos, e riste de mim. Ai de
ti, Brasil! Eu já vejo os sinais de tua perdição nos albores de uma tragédia
anunciada para o presente do Século XXI, que não terá mais futuro. Ai de ti,
Brasil – já vejo também as sarças de fogo onde queimarás para sempre! Ai de ti,
Brasil, que não fizeste reforma alguma e que deixaste os corruptos usarem a
democracia para destruí-la. Malditos os laranjas e as firmas sem porta.
Ai
de ti, Miami, para onde fogem os ladrões que nadam em vossas piscinas em forma
de vagina e corcoveiam em jet skis, gargalhando de impunidade. Malditas as
bermudas cor-de-rosa, barrigas arrogantes e carrões que valem o preço de uma
escola. Maldita a cabeleira do Renan, os olhos cobiçosos de Cunha, malditos vós
que ostentais cabelos acaju, gravatas de bolinhas e jaquetões cobertos de
teflon, onde nada cola. Por que rezais em vossos templos, fariseus de Brasília?
Acaso eu não conheço a multidão de vossos pecados?
Ai
de vós, celebridades cafajestes, que viveis como se estivésseis na Corte de
Luís XIV, entre bolsas Chanel, gargantilhas de pérola, tapetes de zebra e
elefantes de prata. Portais em vosso peito diamantes em que se coagularam as
lágrimas de mil meninas miseráveis. Ai de vós, pois os miseráveis se
desentocarão, e seus trapos vão brilhar mais que vossos Rolex de ouro. Ai de
ti, cascata de camarões!
Tu
não viste o sinal, Brasil. Estás perdido e cego no meio da iniquidade dos
partidos que te assolam e que contemplas com medo e tolerância?
Cingiram
tua fronte com uma coroa de mentiras, e deste risadas ébrias e vãs no seio do
Planalto. Ai de vós, intelectuais, porque tudo sabeis e nada denunciais, por
medo ou vaidade. Ai de vós, acadêmicos que quereis manter a miséria “in vitro”
para legitimar vossas teorias.
Ai
de vós, “bolivarianos” de galinheiro, que financiais países escrotos com juros
baixos, mesmo sem grana para financiar reformas estruturais aqui dentro. Ai de
ti, Brasil, porque os que se diziam a favor da moralidade desmancham hoje as
tuas instituições, diante de nossos olhos impotentes. Ai de ti, que toleraste
uma velha esquerda travestida de moderna.
Malditos
sejais, radicais de cervejaria, de enfermaria e de estrebaria – os bêbados, os
loucos e os burros – que vos queixais do País e tomais vossos chopinhos com “boa
consciência”. Ai de vós, “amantes do povo” – malditos os que usam esse falso
“amor” para justificar suas apropriações indébitas e seus desfalques
“revolucionários”.
Ai
de vós, que dizeis que nada vistes e nada sabeis, com os crimes explodindo em
vossas caras.
Ai
de ti, que ignoraste meus sinais de perigo e só agora descobriste que há
cartéis de empresas que predam o dinheiro público, com a conivência do próprio
poder. Malditas sejam as empresas-fantasma em terrenos baldios, que fazem
viadutos no ar, pontes para o nada, esgotos a céu aberto e rapinam os mínimos
picuás dos miseráveis.
Malditos
os fundos de pensão intocáveis e intocados, com bilhões perdidos na Bolsa, de
propósito, para ocultar seus esbulhos e defraudações. Malditos também
empresários das sombras. Malditos também os que acham que, quanto pior, melhor.
Ai
de ti Brasil, porque sempre te achaste à beira do abismo ou que tua vaca fora
para o brejo. Esse pessimismo endêmico é uma armadilha em que caíste e que te
paralisa, como disse alguém: és um país “com anestesia, mas sem cirurgia”.
Ai
de vós, advogados do diabo que conseguis liminares em chicanas que liberam
criminosos ricos e apodrecem pobres pretos na boca do boi de nossas prisões. Maldita
seja a crapulosa legislação que vos protege há quatro séculos.
Malditos
os compradiços juízes, repulsivos desembargadores, vendilhões de sentenças para
proteger sórdidos interesses políticos. Malditos sejam os que levam dólares nas
meias e nas cuecas e mais ainda aqueles que levam os dólares para as Bahamas.
Ai de vós! A ira de Deus não vai tardar...
Sei
que não adianta vos amaldiçoar, pois nunca mudareis a não ser pela morte,
guerra ou catástrofe social que pode estar mais perto do que pensais. Mas,
mesmo assim, vos amaldiçoo. Ai de ti, Brasil!
Já
vejo as torres brancas de Brasília apontando sobre o mar de lama que inundará o
Cerrado. Já vejo São Paulo invadida pelas periferias, que cobrarão pedágio
sobre vossas Mercedes. Escondidos atrás de cercas elétricas ou fugindo para
Paris, vereis então o que fizestes com o país, com vossa persistente falta de
vergonha.
Malditos
sejais, ó mentirosos, vigaristas, intrujões, tartufos e embusteiros! Que a
peste negra vos cubra de feridas, que vossas línguas mentirosas sequem e que
água alguma vos dessedente. Ai de ti, Brasil, o dia final se aproxima.
Se
vossos canalhas prevalecerem, virá a hidra de sete cabeças e dez chifres em
cada cabeça e voltará o dragão da Inflação. E a prostituta do Atraso virá
montada nele, segurando uma taça cheia de abominações. E ela estará bêbada com
o sangue dos pobres, e em sua testa estará escrito: “Mãe de todas as meretrizes
e mãe de todos os ladrões que paralisam nosso país”. Ai de ti, Brasil! Canta
tua última canção na boquinha da garrafa.
*ARNALDO
JABOR
Cineasta e Jornalista
Da sua coluna em O Globo
Da sua coluna em O Globo
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