sábado, 27 de fevereiro de 2016

ARTIGO - A Natureza Humana e a Economia Nacional (RMR)

A NATUREZA HUMANA
E A ECONOMIA NACIONAL
Rui Martinho Rodrigues*


Penso que existe uma natureza humana. Isto é, o homem não é inteiramente produzido historicamente. A natureza humana que atravessa os séculos e os milênios, sem perder a sua identidade, pode ser constatada no Antigo Testamento da Bíblia.

No Livro de Ruth, e nos livros históricos do Antigo Testamento em geral, vemos os mesmos conflitos, as mesmas paixões, as mesmas ambições. É a tal natureza humana. E essa natureza humana é feroz. O apóstolo Paulo, em suas cartas, fala na luta do espírito contra a carne (natureza humana, feroz e egoísta).

Uma das maiores mentiras (difícil saber qual é a maior delas) da chamada esquerda ideológica é dizer que o homem tem uma natureza boa, ideia claramente expressa por Rousseau, quando disse que “o homem nasce bom e a sociedade o corrompe”. O mistificador disse isso, mas nunca se preocupou em explicar quem corrompeu a sociedade.

Na verdade, a melhor forma de organização política e social é aquela que coloca a mesquinhez humana a serviço da sociedade. Aristóteles se dizia monarquista porque essa forma de governo convocava os homens a servir o interesse público mediante recompensa com honrarias, tornando-os “nobres”. A república, dizia ele, pretende que os homens sirvam à sociedade por virtude cívica. Duvidava o grande pensador que isso pudesse funcionar.

Adam Smith deu mais um passo: disse que a competição e a ambição, colocando o egoísmo a serviço da sociedade, seriam proveitosas. Eu vejo no crediário um exemplo da confirmação disso. Quem criou a venda a crédito só queria ganhar dinheiro. Não pensava em fazer o bem. Mas é o crediário que viabiliza o conforto de milhões de pessoas e aquece a economia gerando emprego, renda e impostos.

A fórmula política que divide as funções do poder (Legislativo, Executivo e Judiciário) também é um esforço para colocar as contradições humanas a serviço do bem comum. A iniciativa privada é dirigida por homens de natureza feroz. Mas eles concorrem entre si, denunciando uns aos outros. O Estado, quando acumula a função jurídico-política com a função econômica, não tem concorrência. Nem tem quem o fiscalize
.

Assim, o que se precisa fazer é limitar a participação do Estado na economia, para que ele fique fiscalizando; além de fortalecer as instituições autônomas dos poderes divididos – é o que o Ministério Público, o Judiciário e a Polícia, no âmbito federal, estão fazendo no caso Lava Jato). A alternância no poder completa o jogo.


A corrupção existe no interior da iniciativa privada, mas é limitada pelo interesse egoístico do dono, que é vigilante – “o olho do dono é que engorda o cavalo” – diz a parêmia. As relações entre empresários e políticos precisam de vigilância externa. Oposição e imprensa deveriam fazer isso. No Brasil, hoje, a oposição tem se omitido.

O setor público só se moraliza quando uma imprensa atuante, uma oposição vigilante e instituições públicas autônomas umas em relação as outras denunciam e limitam os desvios de conduta. Isso se dá porque a mesquinhez aí é posta a serviço do bem comum. O político e o jornalista que denunciam não o fazem por virtude, mas por inveja.



Vejamos os políticos do PT, que fizeram carreira denunciando corrupção e pregando ética. Os fariseus combatem a corrupção por invejar o corrupto, mas, ao fazê-lo, prestam um serviço à sociedade. A indignação é pelo privilégio alheio, e não pela justiça social. Sim, da maldade humana vem o equilíbrio, porque os maus lutam continuamente entre si.

Para que o empreendedor faça investimento é preciso haver confiança. É preciso haver segurança relativa ao marco regulador do ordenamento jurídico vigente. A instabilidade normativa afasta o investidor. É preciso haver um direcionamento estável no planejamento. É preciso haver equilíbrio nas contar públicas para que haja estabilidade monetária. É preciso que haja uma previdência, uma ordem tributária, uma Justiça Trabalhista que inspirem confiança no investidor.

O empreendedorismo do investimento formiguinha é desespero de quem perdeu o emprego ou quer começar a vida e não tem perspectiva, como o jovem que, perto de terminar o curso universitário, já está pensando em tentar um pequeno negócio, porque não há outro caminho. Mas o investimento em logística pesada, como metrôs, portos, aeroportos, ferrovias, etc, este não vêm sem as condições da estabilidade e da segurança.

O investimento público, por outro lado, depende de superávit fiscal e do crédito público. Tivemos mais de uma década quebrando recordes de arrecadação, mas ao invés de fazermos superávits acumulamos uma dívida que já chega a 67% do PIB e continua crescendo a passos largos. E não fizemos nada com o dinheiro que gerou essa dívida. 

Ela foi toda usada para manter a máquina estatal (despesas correntes); fazer política monetária, vendendo títulos para enxugar os meios de pagamento; fazer uma pseudo política social, que não passa de clientelismo; manter o câmbio artificialmente, elevando juros para atrair dólares, gerando despesa financeira com o serviço da dívida.

Na raiz de tudo está o problema das contas públicas. Caso tivéssemos equilíbrio financeiro teríamos poupança pública para investir; teríamos crescimento e não precisaríamos de artifícios com os quais tentamos segurar o câmbio; não teríamos necessidade de enxugar os meios de pagamento lançando títulos e estocando dívida e criando despesas financeiras que desequilibram as contas públicas. O realismo tarifário e cambial completaria o trabalho de soerguimento da economia.

Mas não temos partidos, líderes ou receptividade na sociedade para estas coisas. Vamos continuar trilhando o caminho errado, até que o desastre nos obrigue a reconhecer a realidade simples: não existe almoço de graça; não se colhe sem plantar; não se investe sem poupança; não se tira proveito do crédito mal utilizado, que não gera nenhuma alavancagem.





NOTA DO EDITOR:

A base deontológica do pensamento expresso acima é o postulado de que o dever social do indivíduo não é fazer o bem; mas é não fazer o mal. Ao atuar na vida privada sem fazer o mal, mas procurando fazer o bem a si mesmo, no varejo da licitude, termina por fazer o bem no atacado  quando, visando lucros e outros ganhos pessoais, contribui intelectualmente com o progresso da ciência e com os avanços tecnológicos; ou com o seu trabalho, sua inventividade e seu empreendedorismo, produz confortos sociais  emprego, renda, tributos.    

A prática do mal está prevista e tipificada no ordenamento jurídico, com a suas consequências penais, bem como nos mandamentos religiosos, que ameaçam com “castigos”. A prática do bem é estimulada pelo prazer da caridade, a sublimação do orgulho, pelo diletantismo altruístico de minorar a dor alheia, de forma pontual, o que para qualquer um é uma faculdade, mas para ninguém é obrigação – e tampouco é solução coletiva para o drama humano como um todo.

O ser humano é egoísta por natureza, psiquicamente programado para sobreviver e prosperar, o que importa em concorrer na sociedade e em lutar com os circunstantes em prol de seus próprios interesses. Se for temente à Deus ou às tenazes da Justiça, o indivíduo segue as normas de conduta postas, místicas ou jurídicas, e de forma indireta se constitui em benfeitor da sociedade.

Esse processo justifica, inclusive, o celibato no sacerdócio, pois para não concorrer na sociedade e não se confrontar com o próximo, dedicando-se unicamente ao amor universal, em busca da virtude, o “pastor de almas” celibatário de qualquer religião se procura isentar do amor romântico, e da consequente constituição familiar.

Na primeira fase da vida o indivíduo norteia a sua ação anímica pelo sexo, na emulação com os concorrentes na busca do parceiro ideal, e, vencida essa etapa, ele passa a defender seu próprio núcleo familiar, o seu clã e o patrimônio que deixará aos futuros sucessores, o que impende em concorrência e em egoístico confronto de interesses, ainda que de forma lícita e pacífica. Esse processo é inevitável quando não se é celibatário.  

Alguns não cometem ilícitos por lhe faltarem oportunidades (“não faço porque não posso). Os demais temem a Justiça (“não faço porque não ouso”). Porém, quando na luta pelo progresso pessoal a concupiscência eventualmente suplanta o medo e faz delir as suas cautelas racionais,  então a pessoa  incide em delinquência. Isso, em não havendo princípios éticos intransigentes, sedimentados no espírito da pessoa pela via da moral, que não depende da razão (“não faço porque não devo”) – e esses são casos muito raros.

Essa é a saga dos políticos corruptores alcançados pela Operação Lava Jato, que se quiseram eternizar no poder “fazendo o diabo”, bem como dos empresários por eles corrompidos, os quais se renderam à condição sine qua non imposta pelo Governo para contratar com o Poder Público.


Tinham que praticar o superfaturamento de contratos, e que firmar contratos fictícios, para o repasse de propinas – único meio de suas empresas sobreviverem no mercado, suplantarem a concorrência e enriquecerem alegremente  mesmo em detrimento da economia e das finanças do País.
         

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