domingo, 27 de novembro de 2016

CRÔNICA - Morre Fidel (RV)


MORRE FIDEL
UMA BOA CAUSA 
COM UM MAU RESULTADO
Reginaldo Vasconcelos*


A data é imprecisa – final dos anos cinquenta, início dos sessenta – eu menino caminhava com meu pai por uma estrada sertaneja, nas proximidades da fazenda em que assistíramos de perto à miséria de uma seca. Perguntei a ele o que era a tal revolução de que eu ouvia falar pelo rádio e nas conversas dos adultos.

Meu pai me respondeu simplificando, mas, por acaso, sendo muito fiel ao que de fato acontecia: “Um sujeito sai perguntando às pessoas do povo se estão satisfeitas com o Governo, e vai reunindo um grupo de insatisfeitos para enfrentar o Exército e tomar o poder”.

Ele, que nunca foi marxista, e sempre foi muito libertário, passava uma certa simpatia na voz pelo que acontecia então em Cuba. Certamente, fosse um jovem cubano, teria meu pai subido a Sierra Maestra com os revoltosos de Fidel, e teria apoiado a “faxina moral” que justificou o “paredon”.

Mas, seguramente, teria se revoltado contra a implantação da ditadura, e se insurgido contra o alinhamento à Rússia, que Fidel Castro a princípio negava pretender, mas que levou a cabo logo na sequência e assim permaneceu perpetuamente.

Morreu meu pai octogenário em janeiro, morre agora Fidel Castro, que era seis anos mais velho. Aquele seguiu inimigo da corrupção e das injustiças sociais até a morte, porém sempre pela via democrática da direita. Este último partiu de uma causa nobre e em seguida ficou refém da conjuntura mundial, obrigado a manter a ditadura sob pena de ver ruir a revolução e assistir à desgraça de sua causa.

O preço foi o isolamento e a indigência do seu povo, que ele tirou da miséria e da ignorância, lhe garantindo educação, saúde e segurança (calcanhares de aquiles do capitalismo), mas que não pode acompanhar a evolução tecnológica e econômica do Planeta, permanecendo onde parou no Século XX.

Nas exéquias de El Comandante dou vivas aos que foram vítima do regime, aos que foram condenados à pobreza digna, aos que se exilaram, aos que foram exilados, às filhas que o execravam, aos que perderam a liberdade de pensar e de ir e vir, aos que foram justiçados… e as minhas condolências ao irmão Raul, aos que tentaram seguir o exemplo em seus países e fracassaram inteiramente. Aos que em vão investiram toda a sua vida pela causa, que infelizmente tomou caminho errático, mas que continuam apaixonados.



COMENTÁRIOS:

Camarada Reginaldo, parabéns pelo comentário desapaixonado e livre de qualquer patrulhamento ideológico, sobre o que o velho comandante Fidel representou para o seu povo, com suas contradições e bravura, ainda que o modelo político, e os métodos autoritários, aos olhos do mundo e de parte dos seus concidadãos, anulem alguns dos resultados positivos alcançados, como nas áreas de saúde, educação e esporte, reconhecidos até por aqueles que o condenam.

Arnaldo Santos




Sobre Fidel:

Penso que, ao fim e ao cabo, foi um tirano a mais. Conquistas? Todos os países tiveram as suas, até o Brasil...

O preço que os cubanos pagam ainda hoje é altíssimo. Estão muito mal. Um médico ganha 30 dólares por mês.

Um cambista ganha mais, lá. O regime apodreceu há muito. Ele quis aguentar o tranco e deu no que deu: totalitarismo, à moda anos 50... Atraso.

Luciano Maia




Caro Reginaldo.

Parabéns pelo excelente artigo sobre Fidel Castro. Mas de quem são as fotos mostradas no artigo?

Abraços.
Cássio



Estimado Cássio, prezado confrade, as fotos são de meu pai e de Fidel. As primeiras, os dois na década de 50, com o mesmo bigode, que certamente era moda.

Nas duas abaixo são o meu genitor, logo que faleceu na UTI, em janeiro deste ano, e a segunda seria do grande ditador cubano, no leito de morte, segundo vazou na Internet. É a única cuja autenticidade é questionável.

A crônica é um gênero de prosa poética que pressupõe fatos verídicos, embora alguns cronistas fantasiem e ficcionem. Não é o meu caso.

Reginaldo 

Um comentário:

  1. Camarada Reginaldo, parabéns pelo comentário desapaixonado e livre de qualquer patrulhamento ideológico, sobre o que o velho comandante Fidel, representou para o seu povo, com suas contradições e bravura, ainda que o modelo político, e os métodos autoritários, aos olhos do mundo e de parte dos seus concidadãos, anulem alguns dos resultados positivos alcançados, como nas áreas de saúde, educação e esporte, reconhecidos até por aqueles que o condenam.

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