sábado, 23 de setembro de 2017

CRÔNICA - A Manada (HE)

A MANADA
Humberto Ellery*


Em maio do ano passado (2016), o Sr. José Sérgio de Oliveira Machado celebrou uma delação premiada com o Sr. Procurador Geral da República, Rodrigo Janot Monteiro de Barros.

Quando as delações vieram a público verificou-se que  Sérgio, munido de um gravador, e usando de astúcia, induzira os senadores Romero Jucá, Renan Calheiros e o ex-presidente José Sarney a fazerem declarações criticando fortemente a Operação Lava-Jato.



Ficou famosa a fala do Jucá dizendo: “...é preciso estancar essa sangria”. Os três personagens disseram coisas que demonstravam um certo temor de que a operação os alcançasse masalém disso, nada tão comprometedor.

Li com muita atenção toda a degravação da denuncia, e, após muito analisar, cheguei à conclusão de que não havia nas falas dos envolvidos nenhum crime tipificado que merecesse uma denuncia formal.

No dia seguinte encontrei alguns amigos e fiz o seguinte comentário:

Essa delação prova três coisas apenas, e duas eu já sabia: que o Sérgio é desonesto e inescrupuloso confesso; novidade pra mim só mesmo  sua deslealdade, pois, nas falas do Sarney, do Jucá e do Renan não vislumbrei crime algum”.

Foi o que bastou para eu ser xingado de “defensor de bandidos”.

Em nada adiantou eu dizer que não defendia, nem defendo, esses três. O que eu defendo, enfaticamente, é a Lei. Se queremos depurar a atividade política, e retirar da vida pública os bandidos que a infestam, temos que fazê-lo sob o império da Lei. Ou nós lutamos para viver sob a força do Direito ou seremos subjugados pelo direito da Força.

Um ano depois a Polícia Federal concluiu que não havia nenhum crime tipificado contra o Sarney, o Jucá e o Renan, conforme eu dissera. Nenhum dos que me chamaram de “defensor de bandidos” veio a mim se desculpar, nem eu quero isso.

Mas o arrogante Janot, antes de pedir o arquivamento da denuncia, do alto de sua empáfia, afirmou: “Os crimes só não foram cometidos porque eu denunciei antes”. Em sua cabeça perturbada ele criou mais uma ferramenta de combate ao crime: a “Delação Preventiva”. Palmas, que ele merece!

Antes de encerrar, um breve parêntese: Embora eu aceite como válido o instituto da “Colaboração Premiada”, não consigo ter simpatia pelos “dedos-duros”, mesmo porque são todos criminosos, por definição.

Agora alguns amigos queridos me avisam que vou acabar “queimando o meu filme”, por defender o Presidente Temer. Vou repetir mais uma vez: minha preocupação é com a Constituição, com o Direito, com a presunção de inocência, até que se prove a culpa.  

Nunca afirmei que o Temer é inocente, pois estaria incorrendo no mesmo erro que combato, dos que o dizem culpado sem uma investigação que conclua pela culpa (ou inocência).

O mais próximo disso a que cheguei foi dizer que, por sua esplêndida condução na recuperação econômica do País, e sua coragem em lutar por reformas tão indispensáveis quanto impopulares, ele tem comigo um crédito de confiança. Um político desonesto não assumiria o formidável desgaste decorrente de uma política austera, voltada para o bem das gerações futuras.

Vou repetir de novo (vou acabar tendo que desenhar): se amanhã o Ministério Público provar que o Temer é corrupto, mudarei de opinião. Tranquilamente.

Mas enquanto existirem contra Temer apenas delações e ilações, que não provam absolutamente nada, como admitiu seguidas vezes o próprio Janot, prefiro acreditar num político que, até “dar um golpe” no PT, jamais teve qualquer denúncia contra si.

Até lá, não darei crédito a bandidos mentirosos  como os brothers Batistas (com Nota Oficial assumindo seu desapreço pela verdade), ou como esse tal Lúcio Funaro, que, mesmo nunca tendo visto o Temer de perto, diz que “tem certeza quase absoluta de que ouviu falarem que não sei quem me disse que, não sei onde, alguém contou que parece estar cada vez mais convencido de que é verdade”. É a nova “delação terceirizada” (royalties para o jornalista Carlos Andreazza).

A parte da imprensa que está engajada no “Projeto Fora Temer”, utilizando a máquina petista de assassinar reputações,  já arranjou até uma profissão para o picareta do Funaro: “Operador Financeiro”.

Por último: Não vou seguir “cientistas políticos”, “especialistas”, colunistas ou comentaristas, principalmente da Globo News. Sigo a minha cabeça, a minha capacidade de discernimento e até a minha intuição. Sou infenso a seguir manadas.

Como no Cântico Negro do José Régio: “Não sei por onde vou /  Não sei para onde vou / Sei que não vou por aí!










COMENTÁRIO:

O ínclito, lúcido, e – por que não dizer? – o sábio confrade Humberto Ellery, meu estimado contraparente, é um aguerrido defensor de suas ideias e de suas próprias conclusões, o que, por todos os títulos, é edificante e admirável.

Todavia, a chamada “verdade real”, que é o grande objetivo do persecutio criminis, tem os mesmos atributos fugidios e miméticos do lagarto estelião: hora parece estar aqui, hora parece estar acolá; hora parece ser assim, hora parece ser assado.  

Então, a Polícia e o Ministério Público, que mourejam no procedimento criminal que a mídia escrutina, vão apanhando tudo que semelhe ser o réptil procurado. Na fase processual é que a verdadeira coloração da sua pele é enfim identificada.

Sim. Os investigadores não têm que ser imparciais. Eles apresentam no inquérito e na denúncia uma verdade horizontal, um quadro fático em duas dimensões, sem o necessário contraditório, cabendo ao Judiciário verticalizar, aprofundar, tridimensionalizar a verdade, para absolver ou condenar.

No caso, segundo Ellery, Michel Temer – tradicional aliado petista, líder de um grupo político muito suspeito, compositor de um Ministério com vários réus-presos, com o principal assessor pilhado em circunstância indefensável  seria ele o que se poderia chamar de um “corrupto Denorex”: tem cara da corrupto, tem cheiro de corrupto, vive cercado de corruptos, entretanto é honesto como a mulher de César, porque, realmente, até aqui, não há contra ele uma só prova cabal.

Eu sou advogado, com experiência no processo-crime e longa militância no Tribunal do Júri, e sei que diante de uma acusação não há neutralidade: ou a pessoa adota a tese incriminadora, ou assume os argumentos da defesa. Ou acredita no advogado, ou aceita a verdade da promotoria.

Assim, enquanto o camaleão da verdade real ainda não revelou exatamente onde está, nem a sua real pele mosqueada, o critério do observador é aleatório ou afetivo.

Para mim, Temer está na posição bíblica do inditoso Bom Ladrão. Embora ladrão e crucificado, suando e sangrando, está apoiando a boa causa cristã e não merece descer ao inferno – até porque, se o fizer agora, o Brasil vai afundar nas trevas. A política econômica está certa, estamos superando a crise, as reformas estão em curso, devemos esperar as eleições.  

Resultado da equação: A manada, ressentida e irrefletida, brada “Fora Temer!”; eu o culpo, mas, racionalmente, digo “Fica Temer”; Ellery o prefere desculpar e absolver.

Reginaldo Vasconcelos
          


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