quarta-feira, 5 de março de 2014

CARNAVAL

UM POR TODOS, TODOS POR UM
Reginaldo Vasconcelos*
         

O carnaval nasceu como uma festa grega pagã dedicada à fertilidade da terra, sendo depois encampada pela igreja católica, lá pelo século XI, colocado no termo dos quarenta dias de jejum, a quaresma, que preparavam para a Páscoa.

Na idade média europeia, entrando pelo período colonial brasileiro, os folguedos carnavalescos se resumiam ao “entrudo”, caracterizado pela batalha amistosa de líquidos e de pós, manifestação que sobrevive até hoje, em determinados locais do Brasil – o chamado “mela-mela”.
   
No Século XIX Paris exportou para o mundo todo o carnaval romântico, simbolizado pelo triângulo amoroso entre Pierrô, Arlequim e Colombina, personagens da Comédia dellArte italiana que se constituíram nas primeiras e mais clássicas fantasias.
 
São dessa época os pomposos bailes de máscaras, o uso de confete e serpentina, o corso de veículos pelas ruas das cidades, e as músicas tratando de amores difíceis ou efêmeros que se tornam mais possíveis pelas licenciosidades momescas, e muitas vezes se frustram na quarta-feira de cinzas.

Todos esses componentes ainda podem ser identificados nos carnavais brasileiros dos anos 60 do Século XX, que muitos dos contemporâneos conhecemos, como se verificam em letras de músicas carnavalescas da época: “Vou beijar-te agora, não me leve a mal, hoje é carnaval”.

Esse tipo de composição convivia com as marchinhas burlescas lançadas a cada ano, muitas delas fazendo críticas bem humoradas a situações e personalidades públicas de então, inclusive satirizando novos costumes e ironizando minorias sociais: os negros, os calvos, os homossexuais...     

A esse carnaval romântico do começo do Século XX acrescentaram-se ainda os batuques africanos, que deram origem às escolas de samba e aos maracatus, e o uso do lança-perfume, que visava aromatizar os ambientes das folias, até que foi proibido, pelo o seu uso degenerado e perigoso como alucinógeno inalável.

O carnaval brasileiro atualmente se divide nos desfiles milionários e apoteóticos das ditas “escolas de samba”, notadamente no Rio de Janeiro e em São Paulo; nos cortejos de blocos e cordões de rua e em concentrações nas praças e praias das cidades, ao som de bandas que tocam frevos, marchinhas e paródias, o que se verifica principalmente em Pernambuco; e nos palcos ambulantes sobre caminhões sonoros, os chamados “trios elétricos”, mais comuns em Salvador, priorizando a dita “axé-music”.

Esses tipos de carnaval, cada um prevalecendo em específica região do País, no entanto cada um se dissemina também por todo o território nacional, geralmente subvencionado por verbas municipais advindas das secretarias de cultura ou turismo das cidades, o que facilitou a vida dos carnavalescos, mas os tornou muito dependentes da Administração Pública e da política. 
  
Em Fortaleza, o folclorista Dilson Pinheiro, titular da ACLJ, luta há sete anos para preservar o carnaval romântico dos anos 60, promovendo festas nos sábados que antecedem o tríduo momesco, e nas quatro noites de momo, defronte ao Bar da Mocinha, na Praia de Iracema, reunindo um grupo numeroso de foliões mais saudosistas.
 
Neste carnaval de 2014, por acaso, Dilson conseguiu mais um item característico da espontaneidade dos velhos carnavais, que sempre foram promovidos e custeados pelo povo – não através do erário público, mas do bolso dos próprios brincantes, que se cotizavam para decorar os clubes, confeccionar os estandartes e pagar às bandas de músicas necessárias.

Desta vez a Prefeitura de Fortaleza, de última hora, comunicou que sonegaria a verba prometida para a promoção da festa do Bar da Mocinha. Porém, os seus tradicionais frequentadores compareceram em massa, todas as noites do carnaval, e participaram de uma cota livre para custear o cachê dos músicos. Foi mais uma heroica vitória do nosso confrade Dilson Pinheiro, que consagrou o lema do mosqueteiro de que se costuma fantasiar: "um por todos, todos por um". 




*Reginaldo Vasconcelos
Advogado e Jornalista
Titular da Cadeira de nº 20 da ACLJ

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