sexta-feira, 3 de junho de 2022

ARTIGO - Traduzir a Poesia (JPR)

 TRADUZIR A POESIA BRASILEIRA
E CEARENSE, NA FRANÇA
Jean-Pierre Rousseau*

 

Durante os vinte e seis anos que andei regularmente no Ceará, me orgulho de ter conhecido uma grande geração de poetas: Francisco Carvalho, Artur Eduardo Benevides, Jorge Tufic, Luciano Maia, entre outros, e de tê-los traduzido.

Sempre me encantaram a proximidade humana de suas poesias e a sua beleza formal, que sabe unir o legado tradicional e a modernidade. 

Considerei como minha missão transmitir na paisagem lírica francesa, um tanto esclerosada e intelectualizante, o sopro de frescor que traz aquela poesia. 

Esse trabalho foi coroado, mais ou menos, de sucesso. Lembro que, em 2005, Ano do Brasil na França, inúmeros exemplares de poemas  de José Albano, Patativa do Assaré e Luciano Maia, traduzidos por mim, foram exibidos no metrô parisiense. 

Ultimamente, uma antologia que lancei (Anthologie des grands poètes contemporains du Brésil, Éditions Unicité, 2020) foi adquirida por dezenove bibliotecas universitárias em todo o pais. Ela reúne quinze poetas, entre os quais alguns que citei no início do artigo. Assim, Francisco Carvalho, Artur Eduardo Benevides, Geraldo Mello Mourão se acham ao lado de nomes como Cecília Meireles, Mário Quintana ou Vinícius de Moraes, que também traduzi para o francês. 

Com o editor insistindo para que eu retomasse um trabalho anterior consagrado aos poetas cearenses (Poésie du Nordeste du Brésil, Cahiers bleus, 2002), acrescentei à lista acima mencionada um anexo especialmente focado nesses poetas de cunho mais regional. Assim se acham no livro também poetas como Antônio Tomás ou Patativa do Assaré, representante duma poesia popular e oral cuja sobrevivência é uma especificidade do Brasil. 

Entre as reações que recebi ao livro, destaco esse, do escritor Christian Bobin: “A simplicidade é a joia escondida no mais profundo da linguagem – como um coração que bateria debaixo da terra. 'Vossos' poetas brasileiros não têm outra pretensão que de trazer na superfície da página a água límpida dum silêncio. É a major ambição”. 

O mercado da poesia é extremamente limitado na França, e os editores têm muitas vezes dificuldade para sobreviver. As tiragens são quase confidenciais e se vendem essencialmente na ocasião de leituras. 

Posso testemunhar que a poesia brasileira e cearense quase sempre toca o publico francês, desde que ela consegue chegar até ele. Não é tão frequente, nosso mundo submerso nas informações e na cultura da aparência, que a alma humana ouvisse falar dela mesma, de maneira tão profunda e genuína.

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