sexta-feira, 16 de março de 2012

FORTALEZA - DESRESPEITO À MEMÓRIA ARQUITETÔNICA

Velho cartão postal da cidade, com o Castelo do Plácido
No início dos anos 70, Fortaleza ainda não tinha shoping Center nem centro de convenções. Foi  quando fizemos um projeto para utilizar o prédio abandonado do Castelo do Plácido, na Av. Santos Dumont, para ali promover uma grande festa no Dia das Crianças. 

A ideia era celebrar uma locação com os proprietários, cercar a área de tapumes, pintar de róseo o velho castelo, dotá-lo de iluminação feérica, montar um parque infantil em seu entorno, colocar bonecos do Walt Disney interagindo com as pessoas. Procuramos a TV Verdes Mares, recém inaugurada, para dividir a promoção em parceria, como era comum acontecer naquela época.

Fomos recebidos pelo jornalista Sabino Henrique, então editor local do Jornal Nacional e responsável pelo setor de eventos da emissora. Apresentamos o nosso projeto, que ao final foi indeferido porque concluíram que o edifício poderia ruir sobre as crianças. 

Pouco tempo depois um grupo empresarial que adquiriu o prédio para naquele espaço construir um supermercado o demoliu, e as picaretas hidráulicas sofreram muito para remover cada tijolo, ficando então patente que a construção era segura, absolutamente sólida, edificada para ficar de pé por muitos séculos.

Talvez, se tivessem os homens da área de eventos daquela época topado a empreitada, apoiando o nosso ousado projeto, a festa da criança no Castelo do Plácido teria sido um sucesso e teria entrado para o calendário anual desta cidade.

Castelo da Disney
Tornado equipamento útil à sociedade e rentável para os proprietários, possivelmente não tivesse sido o castelo vendido e demolido, já que somente a importância estética e histórica não é suficiente para proteger o patrimônio arquitetônico brasileiro. Empresários sem cultura humanística querem lucros a qualquer custo e os políticos, mais ignaros ainda, querem votos, ambições que para eles são prioritárias ante os valores culturais.

Descaso e perigo
Agora é o prédio histórico da antiga Casa Paroquial de Fortaleza, onde até recentemente funcionou a Escola Nossa Senhora Aparecida, na esquina da Av. Santos Dumont com a Rua Coronel Ferraz, que ameaça ruir sobre as pessoas e automóveis que circulam por lá, sem que ninguém se incomode com isso e sem que as autoridades se abalancem para evitar que desmorone.

Amarrações precárias
Segundo informa a administração do Colégio da Imaculada Conceição, que lhe fica próximo, o prédio pertence ao clero local, mas não se sabe se foi tombado pelo competente setor do Poder Público, nem qual seria a causa de seu estado de abandono. Inclusive, segundo se diz, ali teria sido alfabetizado o ex-presidente Humberto de Alencar Castelo Branco – dado que, em qualquer país sério, já seria suficiente para consagrar uma relíquia histórica do patrimônio nacional.  

Se o prédio tiver “sofrido” o tombamento, neste nosso país de contradições, pode vir daí sua maior desgraça, tendo em vista que, porquanto essa providência administrativa teoricamente vise proteger o patrimônio arquitetônico, termina por proibir que se promova, com a necessária rapidez, a sua restauração conservadora, antes de se vencer uma burocracia monstruosa.
  
Cine São Luiz
Por exemplo, o arquiteto Fausto Nilo, por encomenda dos antigos proprietários, concebeu um magnífico projeto para revitalizar (e salvar) o Edifício São Luiz, na Praça do Ferreira, onde funcionou por muitos anos a nossa maior e mais bela sala de cinema, mas seu trabalho não pode mais ser aproveitado pelo Governo do Estado, que adquiriu recentemente o imóvel, porque após a elaboração do projeto do Fausto o prédio foi tombado pelo Patrimônio Histórico.

Paredes pichadas
Outro descalabro crônico com o patrimônio da cidade vem se arrastando há anos, com o   naipe situado na área da chamada Praça dos Leões, que além do próprio largo General Tibúrcio envolve o prédio do Museu Histórico, onde funcionou a Assembleia Legislativa, a Igreja do Rosário, e o Palácio da Luz, antiga sede do Governo do Estado, que hoje abriga a Academia Cearense de Letras, além de outras confrarias literárias.
Lâmpadas furtadas

Não há quem proteja aquele logradouro do vandalismo desvairado, paraíso dos vagabundos, dos drogados, dos pichadores, dos mutiladores de estátuas e dos ladrões de lâmpadas da iluminação pública e dos refletores das fachadas.

Diante disso, apelemos ao Governador do Estado, à Prefeitura, ao Iphan, ao Ministério Público, ao Arcebispado, às famílias a que hipoteticamente pertencem imóveis desses, aos magistrados que porventura presidam demandas cíveis envolvendo tais prédios, enfim, a quem de qualquer maneira possa intervir, transigir, ou agilitar providências, para proteger e preservar a memória física da cidade.

Postado por Reginaldo Vasconcelos

Um comentário:

  1. Parabéns,Dr.Reginaldo Vasconcelos! Texto que representa a triste realidade de uma sociedade que ainda não alcançou um nível satisfatório de respeito e de valorização de sua própria História,e de seu patrimônio.

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