segunda-feira, 22 de março de 2021

ARTIGO - Falung Gong: Sonho de Liberdade na China (LA)

 FALUN GONG:
SONHO DE LIBERDADE
NA CHINA
Luciara Aragão*

  

A filosofia estoica ajudou a considerar que os homens podem ser iguais em essências, mas não em habilidades. O homem excepcional tem uma missão como a de reafirmar antigas práticas religiosas e instituições tradicionais. Valores greco-romanos assumidos nos Séculos XIX e XX provaram sua precariedade, pois, como sabemos, esses homens excepcionais não estão sempre à disposição. Seria a filosofia resistente demais para as pessoas comuns? 

Aos poucos, o estoicismo foi substituído pela ideia de salvação e da saúde da alma. O povo comum prendia-se a amuletos e talismãs religiosos eram disputados. Quanto maiores as conturbações como as das passagens dos Séculos II para o III e deste, para o IV – maiores e mais fortes oportunidades parecem se abrir às doutrinas de salvação. 

Modernamente, escasseiam homens como Napoleão Bismarck, Charles de Gaulle e Mandela. Até mesmo a ideia difundida do “estadista”, parecendo desconhecer a complexidade do seu papel, resvala para “louvores” provincianos as modestas figuras de edis e governadores. Na arena internacional, no caso da China, o grande homem, dissolvido atrás do Partido, é a rigor uma distorção daquilo que representou o imperador Augusto, despido também da inspiração estoica que levou Marco Aurélio a escrever meditações. 

Creio que poucos países terão tão pouca liberdade, inclusive a liberdade religiosa, quanto a China. Neste país, a Assembleia Nacional proíbe os “cultos heréticos” e impõe pesadas penas a seus seguidores. Independente do Partido Comunista Chinês (PC) classificar a Falun Gong de culto satânico, tal como os Davidianos nos Estados Unidos e as seitas da Verdade Suprema do Japão, há toda uma efervescência em torno do repúdio a prisões e repressões dos seus membros. Hong Kong é bem o centro apropriado para este tipo de contestação e o simples fato delas existirem já é um fator gerador de resistência.


A propósito, a Falun Gong, que mistura ensinamentos taoístas e budistas. Seu líder, exilado nos Estados Unidos Li Hongzhi – diz ser uma encarnação de Buda. Vale à pena assinalar que a seita enfrentou as autoridades e a vigilância policial. Ousadamente elevaram a tensão em Pequim, já desde abril de 1999, quando surpreenderam o governo com um protesto na Praça Tiananmen pedindo o reconhecimento oficial do culto. 

Ao longo do tempo, sabemos que os parcos resultados se esvaneceram, embora, a religiosidade chinesa continue a passar pelo politeísmo, com suas múltiplas divindades representativas da riqueza e protetora de atividades e profissões. Essas tradições de espiritualidade foram absorvidas pelo budismo, taoísmo e pela própria filosofia do confucionismo. 

A devoção aos astros, superstições várias, ligadas a números e a espelhos permeia o mundo espiritual chinês. O grande interesse suscitado pelo cristianismo foi reprimido e é quase clandestino, mais além dos esforços e concessões de Francisco para proteger os perseguidos e os torturados católicos chineses. A única tolerância do Estado continua a ser com a chamada religião tradicional chinesa que idolatra os antepassados, pratica a comunicação com o mundo espiritual e a crença na outra vida, onde os mortos aproveitam as ofertas postas nos túmulos. 

O crescimento e a força semeada da Falun Gong, à base de exercícios de respiração e meditação, pode não ter nada a ver com Marco Aurélio, mas, assinalou uma tentativa de mudança e liberdade na China, desde então. Tipos de movimentos religiosos, num país asfixiado, podem bem ratificar a necessidade de sobrevivência do espirito humano. Será alguma novidade dizer que as ideias continuam movendo o mundo?

  

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