domingo, 6 de abril de 2025

ARTIGO - Saudades de Lucidez - Parte 3 (RMR)

 SAUDADES DA LUCIDEZ
Parte 3

Rui Martinho Rodrigues* 


O método de dominação das consciências A manipulação semântica é tática de dominação das consciências. Ressignificação sob medida das palavras para fomentar conflitos é exemplo disso. O mundo inteiro se transformou em campo de batalha. Atribuir a reflexos de situações injustas e opressivas dos contextos sociais, ressaltados por Labov, como criação especialmente destinada a acicatar grupos identitários uns contra os outros é teoria conspiratória do processo evolutivo das línguas. É o caso de palavras que podem indicar o gênero masculino ou neutro, apresentadas como forma de desprezar a mulher. 

Apresentar sentimentos inferiores como se fossem virtudes é uma tática de manipulação das consciências. A inveja pode ser apresentada como justa indignação em face da desigualdade social. A substituição de palavras é um complemento da manobra de ressignificação.  Desigualdade deve designar apenas a diferença injusta, conforme explica José D’Assunção Barros (1957 – vivo), na obra Igualdade e diferença. Dizer que a discrepância entre a renda de um jogador de futebol regiamente remunerado e a de um professor cheio de títulos acadêmicos é uma “desigualdade” é o mesmo que afirmar que tal desnível é injusto.

O jogador e o professor atendem demandas que não podem ser comparadas, a fonte pagadora de cada um deles também é diferente. O caso não é de desigualdade, mas simples diferença. A aparente revolta com a “desigualdade” encontra terreno fértil na falta de informação sobre a liberdade dos agentes econômicos que remuneram o jogador e a natureza da fonte pagadora do professor. Trata-se, ainda, de uma autoproclamação de “virtudes” de quem se revolta contra a “injustiça”. Pode também servir de biombo para esconder a inveja, como pode refletir a falta de compreensão da complexidade que envolve o objeto da discussão. Pode, ainda, ser – e muitas é – um sofisma elaborado conscientemente para manipular desinformando. 

Necessidades não são sinônimos de direitos Proclamar direitos é outra forma de exibição de “virtude” e de “legítima” e “corajosa” reivindicação. Aristóteles (384 a.C. – 322 a.C.), na obra A Política, ao discorrer sobre o espírito dos regimes políticos e a forma degradada de cada um deles, diz, a respeito da democracia, que o espírito desta é a virtude, porque os agentes públicos devem servir desinteressadamente à nação. 

Quanto à forma decadente do regime republicano, o Estagirita a descreve como demagogia. Acrescentemos: ainda que sob a aparência de doutrinas sofisticas.   Confundir necessidades com direitos dotados de exigibilidade contra terceiros; reivindicar direitos potestativos como se fossem direitos subjetivos (dotados de exigibilidade) são formas da democracia decadente aludida por Aristóteles como demagogia.

Todos nós temos necessidade de uma companhia, que também é um justo direito, mas do tipo potestativo, que não pode ser proibido, obstado ou dificultado. Mas ninguém pode alegar tal direito para exigir de alguém lhe faça companhia. Alegar necessidades e direitos potestativos, ainda que em elegante embalagem, é demagogia e é técnica de manipulação das massas.


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