domingo, 27 de fevereiro de 2022

RESENHA - Reunião Virtual da ACLJ (26.02.2022)

 REUNIÃO VIRTUAL DA ACLJ
   (26.02.2022)





PARTICIPANTES

Estiveram reunidos na conferência virtual deste sábado, que teve duração de uma hora, seis acadêmicos. O Jornalista e Advogado Reginaldo Vasconcelos,  o Jornalista e Sociólogo Arnaldo Santos, o Professor e Procurador Federal Edmar Ribeiro, o Professor, Teólogo e Latinista Pedro Bezerra de Araújo, o Marchand e Publicitário Sávio Queiroz Costa, e o Agente Comercial Internacional  Dennis Clark (Maringá-PR). 

Pedro Araújo compareceu fantasiado de agricultor chinês, com o tradicional chapéu cônico de palha de arroz, e Reginaldo usando uma bata indiana, que vestia na última festa carnavalesca de que pode participar, antes da pandemia, em 2020.  

Simbolicamente presentes, porque justificaram previamente a suas ausências, o Bacharel em Direito e Especialista em Comércio Exterior Stênio Pimentel (Maricá - RJ), o Linguista Dmitry Sidorenko (São-Peterburgo-RU)  e o Advogado Adriano Jorge. 
  



TEMA ABORDADO

Na reunião virtual da ACLJ deste sábado os participantes se dedicaram ao inescapável tema  do carnaval, melancolicamente, já que as comemorações da data se mantêm proibidas pelas cautelas sanitárias impostas pela pandemia. 

Arnaldo Santos lembrou de que, mesmo não apreciando carnaval, como profissional de imprensa, muitos anos atrás, cobriu um desfile de blocos na avenida, para o rádio, juntamente com o Ricardo Guilherme, hoje nosso Membro Honorário. 

Edmar Ribeiro narrou que, no Acre da sua infância, durante o carnaval, homens se reuniam caracterizados de marinheiros, sob a liderança de um "comandante", transportando no ombro uma miniatura de navio-gaiola, e saíam itinerantes pelas ruas e vielas, com acesso franqueado às residenciais, onde eram servidos de bebidas e comidas previamente preparadas para a sua recepção. Era a chamada "marujada", o que faz lembrar os antigos grupos de "reisado", em figura de raposa, nos Dias de Reis, a cada seis de janeiro. 

E também acrescentou que, em baile carnavalesco do passado, tendo uma das pernas enfraquecida, assistia aos folguedos sentado, com a sua muleta ao lado. Até que um folião embriagado sequestrou o objeto e o levou para o salão, onde foi alcançado por um corpulento cunhado do Edmar, irmão da sua namorada na época. Contido pelas bitáculas, o brincalhão pediu desculpas, alegando que iria devolver o objeto, e que tinha imaginado fosse parte de uma fantasia de pirata.  

Sávio Queiroz narrou uma lendária história de família, segundo a qual um avô seu, durante um carnaval pretérito, se preparava para cair na folia, contra a vontade da mulher, que não era súdita do Rei Momo. Ao defrontar o marido saindo de casa, ela fixou-lhe o olhar tão repreensivo, que, ato continuo, o pretenso folião escorregou e caiu – e quebrou a perna em consequência do escorrego.

PERFORMANCES

Edmar Ribeiro apresentou a coletânea "Vento Vadio", da qual fez a leitura de uma belíssima crônica do jornalista multimídia pernambucano Antônio Maria (1921-1964), que abaixo reproduzimos.


 

A MESA DO CAFÉ

Menino só sabe que é feio, no colégio, quando o padre escolhe os que vão ajudar à missa, os que vão sair de anjo, na procissão, e os que vão constituir a diretoria do Grêmio Mariano. 

Eu soube que não era bonito em 1928, no Colégio Marista de Recife. Nunca fui escolhido. Mas sem a menor tristeza, sem concordar até. Aquele julgamento era precipitado, pois (estava convencido) ainda não havia nada de definitivo sobre o bonito e o feio, a beleza e a fealdade. Quais seriam as demarcações? A exata limítrofe, quem seria capaz de determinar? Se não existia a explicação lógica do feio e do bonito, a notícia da minha feiura não me causava mal nenhum. Ao contrário, livrava-me dos tributos que teria que pagar se fosse bonito, ajudando missa e saindo de anjo, à frente das procissões. 

Na mesa do café, éramos cinco irmãos. Havia bolo de mandioca, requeijão, bananas fritas, pão torrado e bolacha d’água. Éramos cinco irmãos e, dos cinco, quatro eram bonitos. Vá lá, eu era o feio. Então, por que minha mãe gostava mais de mim? Ela, que nos zelava a todos, que nos conhecia pelo avesso e pelo direito, por que gostava mais de mim? De pena não era, porque pena é uma coisa e amor é outra. Menino conhece. O gesto complacente, por mais carinhoso, é sempre vacilante e triste. O gesto de amor chega a ser bruto, de tão livre, alegre e descuidado. 

Minha mãe gostava mais de mim. Eu sabia, e ela sabia que eu sabia. Em tudo a nossa cumplicidade. Na fatia do bolo, na talhada de requeijão e no sobejo do seu copo d’água. Nossa cumplicidade até hoje existe, quando de raro em raro nos encontramos. 

Da mesa do café víamos pela vidraça os canteiros de terra negra e as rosas de maio. Vinha o cheiro úmido da terra molhada, mais que o das pálidas rosas da minha infância. 

Minha mãe e eu. Nossos olhos tão parecidos. 

Minha mãe só tem um defeito. Não ser minha filha. Sempre foi metida a saber mais que eu. 

Só soube que era feio quando amei pela primeira vez. Vi-me, então, corajosamente… e não era como gostaria de ser. No coração, um amor tão bonito. Ninguém iria acreditar, mesmo dizendo, mesmo eu explicando, mesmo eu jurando. 

Apaguei a luz, tocava o concerto n. 3 de Beethoven e, no final, apesar do tom ser menor, o lirismo era tão ardente que tudo ficou entendido, entre mim e a minha feiura: eu a amava e não a abandonaria até a morte. 

(Antônio Maria, in “Crônicas”, 26/09/1961)




Pedro Araújo, por seu turno, fez a leitura do soneto Acácia Amarela, Do livro “Recôndito das Pérolas” da escritora sobralense Célia Oliveira, abaixo colacionado.

ACÁCIA AMARELA
 Célia Oliveira

Uma Acácia Amarela
nasceu no meu jardim
floresce em julho e dezembro
também dentro de mim.
 
Eu tenho uma acácia!
De flores amarelas
qual bolas de ouro
fico embevecida diante delas.
 
Minha acácia é primordial
simboliza acato e amizade
É árvore de porte imperial
 
Suas flores frágeis e belas
não só ataviam minh'alma
enfloram os beirais
de minhas janelas. 

 

 


Reginaldo Vasconcelos, por último, leu crônica sua "O Inverso e o Carnaval, publicada em jornal em 1980, e em coletânea posterior, em 1993, que descreve o carnaval de Fortaleza há 30, 40, 50 anos, quando ainda havia os bailes nos clubes sociais  durante o dia infantis, à noite adultos  além do corso de automóveis pela rua principal, além do desfile de cordões, blocos, maracatus  única dessas manifestações que ainda se mantém, embora pouco prestigiada pelo público, que, em grande parte, deixa a Cidade para retiros de repouso, ou para cidades do litoral ou da montanha, durante o período momino.

O INVERNO E O CARNAVAL

 

O carnaval e o inverno coincidem, coexistem, misturam-se e molham um ao outro de alegria. O inverno é o carnaval da Natureza, que se fantasia de verde a festejá-lo, numa alegria gigantesca. Úmidos corpos molham fantasias coloridas, brotam amores, chovem sorrisos e abraços são colhidos. 

Cheiro de terra, grama molhada e poças d’água nas calçadas. Antes de tudo, o inverno e o carnaval são perfumes e cores, que, portanto, podem descolorir e evaporar durante a vida e os anos sobrepostos. 

Milhares de crianças vestem penas, pintam o rosto, colocam máscaras, usam panos de sede e calçam botas: são índios, super-homens e piratas. Os adultos tornam-se palhaços, viram tuaregues, ou transformam-se em havaianas e odaliscas. 

No meio da folia, no epicentro da algazarra, no momento da fervura cai a chuva. Rostos suados, gotas brilhando entre lantejoulas e confetes. Plumas e paetês apanham chuva nos cordões, bumbos e cornetas salpicam som, sopram chuviscos. 

Pelo asfalto, nos estandartes os símbolos místicos do baralho, desce o maracatu titubeando ao “chimbum” afro dos tambores, e ao tinir dos guizos, triângulos e chocalhos. Índios e negros, vestindo os trajes da Corte, trazem à tona as raízes da raça e da cultura, de onde se eleva o éter envolvente da história. 

Sob os véus das fantasias veem-se os corpos mornos da folia, molhados de suor. Entre apitos, passos de dança e evoluções uma euforia, um incêndio íntimo. Sorrisos franqueados, empurrões e abraços se permitem, suor e cerveja para a chuva temperar. O carnaval não é loucura. É remédio, é antídoto, alivia a todos da vida insana pela vida, evitando a demência da dor e da solidão. 

No terceiro dia o folião já canta rouco, o bêbado cai de porre na calçada, as fantasias já rasgaram mas ainda resta alegria. E na quarta-feira a chuva chora e lava o asfalto, num chuá sentido de saudade. Nos salões as serpentinas fazem engodos, que simbolizam mil paixões, namoros mominos, recordações mil de outros carnavais.

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By Reginaldo Vasconcelos – In Jornal Tribuna do Ceará – 1980, e Livro Traços da Memória - Laços da Província – 1993.

  




DEDICATÓRIA
 

A reunião virtual deste sábado, dia 26 de fevereiro de 2022, foi dedicada ao empresário Beto Studart, nosso Membro Benemérito, que nesta semana foi instado a suceder ao poeta Pio Rodrigues na distinção de “Representante da Comunidade”, no quadro honorífico da Academia Cearense de Letras, a convite de seu Presidente, Dr. Lúcio Gonçalo de Alcântara.


Além disso, Beto Studart foi comunicado, pelo Magnífico Reitor Cândido Albuquerque, de que o Conselho Universitário da Universidade Federal do Ceará decidiu lhe conceder o título de Doutor Honoris Causa, subida honraria a que ele faz jus pela sua profícua atuação pela cultura no Estado, seja como mecenas da Academia Cearense de Literatura e Jornalismo, seja como instituidor e mantenedor da Fundação Beto Studart de Incentivo à Cultura. 




 

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