TIPOS POPULARES
Totonho Laprovitera*
Os tipos populares são fundamentais para o desenvolvimento das cidades, pois ajudam a formar a identidade cultural local e fortalecem os laços entre os habitantes. Eles promovem a coesão social, enriquecendo a vida cultural por meio de suas expressões e servem como uma plataforma de crítica social. Assim, desempenham um papel importante na construção de sociedades saudáveis.
Na Cultura Ceará Moleque, mantendo a tradição de um povo gaiato, Fortaleza sempre foi cheia de tipos curiosos, daqueles que chamam a atenção. Dos mais antigos, temos alguns exemplos em ordem alfabética: Andarilho das Medalhas, Bembém Garapeiro, Capitão Pirarucu, Casaca de Urubu, Chagas dos Carneiros, De Rancho, Fabrício, Gerviz, Manezinho do Bispo, Mário Monte, Pilombeta, Quintino Cunha, Raimundo Varão, Rei da Voz, Tertuliano, Tostão, Jararaca, Zé Levi e Zé de Sales. Entre as mulheres estão: Chica Pinote, Ferrugem, Iaiá-Tem-Ovos, Micaela, Mimosa, Mucura, Noiva-do-Tempo, Siri e Teodora.
Dos
mais recentes, lembro do Boca Mole, Burra Preta, Capitão Blue,
Feijão-Sem-Banha, Figo Gordo, Hélio Banha, Luciano da Praça da Lagoinha, Maria
C de Homem, Maria Maranhão, Mário Gomes, Muda, Pedão da Bananada, Primo,
Radiopatrulha, Tá na Hora, Tapioca, Toim Coca-Cola, Zé Tatá e tantos outros
personagens importantes para a história da cidade, que nunca foram registrados
nos compêndios oficiais.
Nos anos 1960 e 1970, essas figuras populares interagiam ativamente com a coletividade de Fortaleza, uma cidade que enfrentava um crescente declínio das desigualdades sociais. Naquele tempo, uma dessas personalidades era o Radiopatrulha, carinhosamente chamado de Radinho.
O bom Radinho era um homem negro, baixinho e fisicamente robusto, com um peito de pombo e uma notável corcunda. Seu andar era ligeiro, e ele sempre mantinha um sorriso no rosto, distribuindo simpatia ao imitar com perfeição diferentes animais. As crianças pediam: “Radinho, imita um porco”, e ele imitava; “Radinho, imita uma galinha”, e ele imitava; “Radinho, imita a Rádio Patrulha”, e ele ligava a sirene de seus formidáveis recursos vocais.
Trabalhador e honesto, o bom Radiopatrulha foi acolhido pela família Pinheiro Beltrão. Tornou-se um faz-tudo da casa e, ao envelhecer, passou a ser o vigia da clínica dentária dos irmãos Haroldo e Paulo, com quem trabalhou até o fim de seus dias.
Por fim, seguramente, os tipos populares promovem a inclusão social ao envolver diferentes camadas da sociedade no combate ao preconceito, contribuindo para o bem-estar de todos nós, viventes.
COMENTÁRIO:
Magistral
o tema antropológico abordado por Totonho Laprovitera sobre os tipos populares,
os flâners, os “Carlitos” que vagavam pelas cidades brasileiras, e por outras
povoações Planeta a fora – notadamente antes da expansão acentuada dos centros
urbanos, e do fenômeno mundial dos moradores de rua.
Com o crescimento das cidades esses elementos excêntricos foram ficando restritos aos seus bairros, salvo aqueles que frequentam pontos centrais, como, em Fortaleza, a Praça do Ferreira, alma mater do intelectual desassisado Mário Gomes e do imenso negro amulherado de alcunha "Burra Preta".
Este,
no advento da AIDS, encontrei na estação rodoviária da cidade, bastante
depauperado. Abordei-o, e ele me disse que estava voltando para morrer na sua
terra, em Pernambuco.
Foi-me muito agradável o resgate da memória que me foi propiciado pelo Totonho, em relação ao chamado “Radinho”, de quem me lembro, muito frequente pela Av. Dom Manuel.
Era um Quasímodo de caixa torácica avantajada, que tinha a habilidade de produzir sons imitatórios – inclusive o da sirene da “radiopatrulha”, que lhe rendia o apelido, e o barulho das grandes “motocicletas” – palavra pela qual, em outros pontos do bairro, as pessoas o chamavam.
Faltaram,
nas citações do Totonho, alguns dos mais antigos e notórios, como o Zé Goela e
o Guará, a que meu pai referia, e o Joaquim, sobre quem publiquei uma crônica
no jornal Tribuna do Ceará, em 1981, reeditada em um dos meus livros.
Reginaldo
Vasconcelos
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