UM SEGUNDO ATRÁS
TUDO AINDA ESTAVA
EM PAZ
Reginaldo Vasconcelos *
Eu assisti extasiado, há alguns dias, a uma magnífica palestra, proferida por um dos mais bem sucedidos empresários do Ceará e do Brasil. No seu minucioso relato biográfico foi revelando como ele e o seu sócio perpétuo começaram a trabalhar, ainda quintanistas da faculdade que cursavam, e ficou claro que, um pouco de sorte e um grande aporte de esforço e competência lhes foram proporcionando a sua gradual evolução.
Ao final da longa exposição sobre a abençoada trajetória do empresário, um dos quarenta convidados presentes pediu que o palestrante narrasse o acidente gravíssimo de que anos atrás ele foi vítima, infausto que na época sensibilizou a sociedade, todos solidários àquele ilustre personagem, tanto entre os seus próximos e mesmo entre os que o conheciam sem serem por ele conhecidos, exatamente no meu caso.
Então, o narrador, que vinha até ali desenvolvendo a linha do tempo sobre os felizes sucessos dos seus muitos negócios – passou a narrar a sua desditosa experiência que, em segundos, o mutilaria e transtornaria a sua vida para sempre. E todos ouvimos comovidos, como quem assiste em câmara lenta à cena dramática do acidente.
Até que uma reflexão do narrador fez esplender na minha alma uma epifania filosófica sobre o curso do destino, imperscrutável e caprichoso. Disse ele: “Um passo a menos e nada me teria acontecido; um passo a mais, e eu seria partido ao meio”.
Passou então a me interessar e comover o passo a mais que ele não deu, e que lhe garantiu a sobrevida, momento em que a graça de Deus lhe concedeu livramento, brindando-lhe a si e aos seus com sua permanecia em vida física.
Pois, saindo do evento, refletindo comigo mesmo sobre a desventura e a ventura que em um segundo se revelam e surpreendem, no estacionamento de automóveis do prédio tropecei em algo e voei de corpo inteiro para o solo, de muito rude pavimento. Durante a longa fração de segundo em que eu me projetava, ouvi um coral de interjeições da multidão de circunstantes: “Ohhhhh!!!”.
Mas eu caí em “apoio de frente”, as duas mãos plantadas no solo, e fiquei de pé imediatamente sem nenhuma consequência – a memória muscular ainda presente no velho praticante das ditas “artes marciais”.
Fixei na minha mente a imagem fotográfica do
momento, e o som vigoroso dos meu anéis sobre o cimento. Talvez um segundo a
menos na minha marcha e eu não teria tropeçado; um segundo a mais e me teria
esborrachado. Então me ocorreu uma paráfrase da letra de famosa canção do Herbert
Viana – “apenas um segundo atrás, tudo ainda estava em paz...”
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